Valor Econômico: Atrito entre PMDB e Planalto ameaça distribuidoras de energia

Embalado pela recente sinalização da presidente Dilma Rousseff de que deve indicar nomes de perfil técnico para os ministérios que hoje são da cota dos pemedebistas, o partido se rebelou novamente e vem acelerando a tramitação de um projeto de decreto legislativo que tramitava há três anos na Câmara e pode custar caro às distribuidoras de energia elétrica.

Se aprovada, a proposta forçará as empresas de distribuição a devolver aos consumidores cerca de R$ 7 bilhões embolsados a mais, entre 2002 e 2009, por conta de uma falha na metodologia de cálculo da tarifa de energia, pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), apontada pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O grande furo é que esse cálculo não considerava os eventuais ganhos de mercado e, por isso, esse lucro adicional ficava com as distribuidoras.

O assunto cria enorme atrito com as 64 empresas do setor, que passam por dificuldades financeiras. O governo prepara um socorro a elas para arcar com os custos que tiveram pelo acionamento das usinas térmicas – despesas que podem atingir R$ 18 bilhões em 2014.

Delicado ao governo, o projeto de autoria do deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), um aliado do Planalto no Congresso, prevê que seja cancelado um ato da Aneel de 2010, segundo o qual, o suposto erro de cálculo deveria ser sanado. No entanto, as distribuidoras não foram obrigadas a ressarcir o consumidor do suposto erro.

A proposta começou a tramitar na Câmara em 2011 e, até semana passada, havia sido aprovada apenas na Comissão de Defesa do Consumidor. No dia 12 de fevereiro deste ano, entretanto, o líder da bancada do PMDB, Eduardo Cunha, segundo congressistas que acompanharam o assunto, resolveu abraçar o projeto, propondo ao presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) que sugerisse a votação, em plenário, do regime de urgência para o projeto.

Todos os líderes, sem exceção, principalmente o do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), foram pegos de surpresa. “Vamos analisar o tema com profundidade”, avaliou Chinaglia. “O Executivo vai analisar se é necessário esse projeto nesse momento.”

No fim das contas, contudo, a urgência foi aprovada. Ou seja, agora a matéria entrou para a pauta do plenário e a qualquer momento pode ser votada. Desfecho muito curioso, uma vez que em 17 de dezembro, o mesmo Eduardo Cunha, em movimento contrário, fez manobra para protelar a tramitação do mesmo PDC 10/2011, obtendo aval do presidente da Câmara para arrastar a proposta para outra comissão – Finanças e Tributação -, mais técnica e que geralmente faz análise demorada dos projetos.

Até deputados que militam no tema da energia são contrários à aprovação do projeto e querem derrubá-lo em plenário. “É um perigo esse projeto ser aprovado. Ele prejudica muito as distribuidoras estaduais como Cemig, Cesp, Copel, por exemplo”, diz o deputado Eduardo Sciarra (PSD-PR).

O deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), que faz oposição ao governo, argumenta que nem todas as distribuidoras tiveram ganhos de mercado e, portanto, ao invés de pagarem deveriam receber dos consumidores em forma de reajuste na conta de luz. “Se esse projeto passar, vai afugentar investimentos na área de energia, porque significaria quebra de contrato.”

Eduardo Cunha nega que ele e seu partido queiram usar esse assunto para polemizar. “Não fiz pressão nenhuma pelo projeto, apenas apoiei sua urgência”, respondeu. “Não sou favorável a nenhum impacto econômico.”

Mesmo que o projeto ainda tenha que tramitar pela Câmara e em seguida pelo Senado, caso realmente seja aprovado as distribuidoras não descartam, nos bastidores, enfrentar uma batalha judicial contra a Aneel. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Fonseca, o próprio TCU, quando se pronunciou a respeito desse imbróglio, foi muito claro em reconhecer que não houve ato ilegal das distribuidoras, logo não há porque elas devolverem recursos. “Esse projeto contraria o respeito aos contratos e pode minar os esforços da própria presidente Dilma Rousseff de vender no exterior a imagem de que há segurança jurídica para os investimentos no Brasil “, analisa ele.

Fonseca ainda acrescentou que nove distribuidoras tiveram redução de mercado à época, logo teriam de receber dos consumidores. E que, caso o decreto comece a vigorar, não só as 55 distribuidoras restantes teriam que devolver o dinheiro como os Estados também teriam que devolver ICMS e encargos arrecadados a mais.

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