Forma como a decisão foi tomada, nas primeiras horas da manhã, seguiu uma trajetória que foge do roteiro desenhado pelo STF. Saída do deputado, um aliado controverso, pode beneficiar Michel Temer.
O afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por meio de uma liminar concedida pelo ministro do Supremo Teori Zavaski provocou surpresa em Brasília. Cunha foi suspenso tanto da presidência da Casa quanto do seu mandato de deputado.
“Todos nós fomos pegos de surpresa”, afirmou o deputado Rogério Rosso (DF), líder do PSD que foi o presidente da Comissão Especial do Impeachment da presidente Dilma na Câmara.
O deputado Paulinho da Força (SD-SP), um dos maiores aliados de Cunha na Câmara, reclamou da decisão. “Ele [Zavascki] criou um fato, porque o julgamento de hoje era outro. Não sei se o Supremo mantém isso, é uma interferência na Câmara, uma intervenção.”
Já o líder do DEM, Pauderney Avelino (AM), afirmou que a decisão pede cautela. “O afastamento de um deputado ou presidente da Câmara pode ser, sim, uma interferência sem o julgamento do pleno. Mas temos de ter cautela”.
Governistas celebraram o afastamento de forma contida. O presidente do PT, Rui Falcão, comemorou em sua conta no Twitter. “Antes tarde do que nunca!”, escreveu.
Outros ainda estão avaliando como encarar o afastamento. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que a decisão pode eventualmente fortalecer um pedido para anular a votação do processo de impeachment na Câmara, cuja sessão foi presidida por Cunha. “Ele deveria ter saído há muito tempo e não deveria ter presidido o processo de impeachment, já que o fez motivado por vingança.”
Assessores do Planalto, por sua vez, afirmaram ao jornal Folha de S.Paulo que o afastamento pode de alguma maneira beneficiar o vice Michel Temer, já que pode resultar na saída de cena de um aliado controverso, com potencial para desgastar um eventual governo do peemedebista.
Já no círculo de Temer, a notícia ainda está sendo digerida. “Impacta tudo, impacta o noticiário, mas temos que aguardar. Vamos ouvir um pouco”, afirmou um integrante não identificado do grupo do vice-presidente ao jornal O Estado de S. Paulo.
Questão de tempo
Analistas apostavam há semanas que era apenas uma questão de tempo para que Cunha, acossado por denúncias, acabasse pelo menos deixando a chefia da Câmara. No entanto, a forma como o afastamento ocorreu, nas primeiras horas da manha desta quinta-feira, seguiu uma trajetória que fugiu do roteiro desenhado pelo STF.
Originalmente, o plenário do STF pretendia se reunir durante a tarde para discutir um pedido de afastamento proposto pela Rede Sustentabilidade na última terça-feira. O partido argumentava que Cunha deveria ser afastado porque não tinha condições de assumir a Presidência da República numa eventual ausência de Michel Temer por ser réu no Supremo.
Mas horas antes da sessão, Teori decidiu enfim atender liminarmente um pedido da Procuradoria-Geral da República apresentado em dezembro, que pedia o afastamento de Cunha por suspeita que o deputado estava usando o cargo para interferir no trabalho da Justiça. Nos últimos meses, Teori vinha sendo criticado e até mesmo sendo acusado de omissão por não se posicionar sobre o caso.
Analistas apontavam que havia também uma tendência entre outros ministros do STF de evitar o assunto, entendendo que o acatamento de qualquer pedido de afastamento poderia configurar uma interferência do Judiciário no Legislativo.
O cenário começou a mudar na noite de quarta-feira, quando o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, decidiu atender um pedido do ministro Marco Aurélio Mello para incluir na pauta desta quinta-feira o pedido de afastamento proposto pela Rede. Ainda assim, havia dúvidas se o plenário do tribunal atenderia ao pedido de afastamento ou procuraria estabelecer um meio-termo, como uma decisão que impedisse que Cunha fosse retirado da linha de sucessão, mas continuasse no cargo na Câmara.
A análise do pedido da Rede ainda está na pauta. Segundo a imprensa brasileira, Teori deve tentar incluir ainda a sua liminar antecipada para análise na sessão do colegiado do STF, o que deve pressionar os ministros a tomarem uma decisão definitiva sobre o afastamento.