O Globo | Opinião: Perigosa autossuficiência

INDIO DA COSTA

A queda na Ciclovia Tim Maia é resultado do modelo de gerenciamento das obras aplicado pelo prefeito Eduardo Paes, que desmontou os órgãos e equipes de acompanhamento e fiscalização, para centralizar a coordenação no seu gabinete e na Casa Civil. Além de outros problemas, a rotina tirou o governo da função indelegável de fiscalizar a aplicação do dinheiro público e afastou do processo os servidores públicos de carreira, categoria estratégica para a qualidade do serviço público, mas altamente desprestigiada pelo prefeito.

O tempo evidenciou que o objetivo do prefeito é usar as obras das Olimpíadas, e todo o resto das decisões dele, na composição de imagem de bom gestor público para alguém que ele quer ter como sucessor.

Contudo, o desejo é sempre contrariado pelas medidas que deveríam satisfazê-lo, como agora no caso da ciclovia. Confirma-se, portanto, a observação da escritora Bárbara Tuchman, na obra “A marcha da insensatez”: “Fenômeno observável ao longo da história, que não se atém a lugares ou períodos, tem sido a busca, pelos governos, de políticas contrárias aos seus próprios interesses”

O ex-prefeito Cesar Maia agiu diferente quando elegeu Luiz Paulo Conde. Participei diretamente do processo e sou testemunha do sucesso do modelo. Em sua primeira gestão, Cesar valorizou os servidores públicos e descentralizou a coordenação e o gerenciamento das obras para delegar ao urbanista Luiz Paulo Conde e equipe, uma das maiores transformações (revitalizações) urbanísticas da cidade.

Conde, através de concurso público gerenciado pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), atraiu os mais importantes escritórios de urbanismo e arquitetura do Rio e uniu todos num mesmo propósito: fazer bem feito e para a vida toda. As favelas foram incorporadas à cidade e os degradados corredores comerciais foram recuperados.

Para coordenar e fiscalizar os projetos, Conde estruturou o Instituto Pereira Passos (IPP) e deu ao urbanismo o conceito amplo para inserir as políticas de habitação, transportes, obras e meio ambiente. Formou um time de primeira grandeza com Sérgio Magalhães, Márcio Fortes, Ângela Fonti, Mareio Queiroz e Alfredo Sirkis, que lideraram, com competência e harmonia, os servidores de carreira. Para acompanhar a execução dos projetos de maior dimensão, funcionou um Conselho de Notáveis.

A disputa pela prefeitura, em 2000, colocou Cesar e Conde em lados opostos, e a briga por votos desmontou a estrutura técnica. No segundo período de César, o urbanismo perdeu visão estratégica e as obras, qualidade.

Eduardo Paes agravou o modelo. Dizimou o IPP, desconsiderou a opinião dos técnicos concursados, delegou a concessionárias e empreiteiras a autoria e fiscalização dos projetos. Criou tragédia e obras agressivas à paisagem bela do Rio. A ciclovia que tirou a vista do mar é um exemplo, e a ponte do metrô, na Barra da Tijuca, um monstrengo que agride a paisagem. O arquiteto Santiago Calatrava desenhou e propôs algo melhor, que foi ignorado.

Há ainda as cicatrizes urbanas feitas pelas novas vias de BRT com estações gigantescas e o indigno boulevard da Avenida Rio Branco. Quem coordenou os projetos? Quem aprovou?

Os buracos e atropelamentos no caminho do BRT da TransOeste e a queda da ciclovia Tim Maia anunciam a possibilidade de riscos nas demais obras, porque todas, com certeza, cumpriram o mesmo roteiro definido pelo prefeito autossuficiente.

Cada vez mais está provado que os projetos políticos consistentes são frutos do respeito à população. As maquiagens feitas para vencer eleição derretem e carregam junto a imagem de quem governa.

O objetivo do prefeito é usar as obras das Olimpíadas, e todo o resto das decisões dele, na composição de imagem de bom gestor público

Indio da Costa é deputado federal (PSD-RJ)

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