Governo sitiado
Defesa
Advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo volta a falar em ‘golpe* Ministro deu a entender que a presidente irá ao STF caso afastamento seja aprovado pela Câmara dos Deputados
RANIER BRAGON
ISABEL FLECK
RUBENS VALENTE
Em uma fala de uma hora e 38 minutos pontuada por frases de efeito contra a destituição de Dilma Rousseff, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, afirmou que o pedido de impeachment da petista é “viciado”, “nulo”, “golpe de Estado”, entre outras qualificações, sinalizando que pode levar o seu desfecho para o Supremo Tribunal Federal.
Cardozo protocolou pessoalmente nesta segunda (4) a defesa de Dilma na comissão especial da Câmara que analisa o impeachment
Ele afirmou ainda que uma eventual gestão do vice-presidente, Michel Temer (PMDB), não terá legitimidade nem governabilidade.
“Se todos os pressupostos forem obedecidos, impeachment não será golpe, será tuna situação extraordinária e excepcionalíssima. Mas se esses pressupostos não forem atendidos […], sem uma ação dolosa, se essa ação não for tipificada, a tentativa de impeachment é golpe de Estado sim”, discursou Cardozo, que foi ministro da Justiça e é um dos principais auxiliares da petista.
Para ele, essa é a atual situação. “O que é um golpe? é a ruptura da institucionalidade, golpe é o rompimento da Constituição, golpe é a a negação do Estado de Direito, não importa se é feito por armas, se é feito com canhões ou com baionetas caladas.”
Em resumo, Cardozo argumenta não haver provas de que Dilma participou diretamente de crime de responsabilidade com gravidade para justificar sua destituição.
Segundo ele, a intenção da oposição e de dissidentes da base aliada é usar uma crise oriunda de disputas políticas para “rasgar” a Constituição.
“Posso dizer a Vossas Excelências que o impeachment que rasga a Constituição por conveniência política traz duas graves consequências: a primeira delas é a ruptura conflituosa. A segunda, igualmente grave, é fazer nascer de um governo sem legitimidade, sem condições de governabilidade.”
O ministro Cardozo prosseguiu dizendo que pouco importa o caráter ético de quem assume.
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DESVIO
Em uma demonstração clara de que o governo pretende recorrer ao STF caso sofra derrota na Câmara, Cardozo disse ainda ter havido “desvio de poder” no acolhimento da denúncia pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
“Cunha usou sua competência para fazer uma vingança e uma retaliação à chefe do Executivo porque esta se recusara a garantir, no Conselho de Ética, à qual ele estava submetido, os votos que o seu partido poderia lhe dar para que ele não pudesse ser processado naquele momento”, disse o AGU.
Isso fez com que a abertura do processo de impeachment ficasse “viciada”, segundo Cardozo, constituindo um “pecado original e inafastável” do processo.
Adversário do governo. Cunha acolheu o pedido de impeachment em dezembro logo após fracassar acordo que tentava firmar com o PT para escapar do processo de cassação que responde no Conselho de Ética.
Cunha respondeu dizendo que Cardozo deveria se ater em “defender o processo, o conteúdo do que ali está”.
O advogado-geral da União destacou várias vezes que o processo de impeachment deve se ater a apenas duas acusações, ambas referentes a 2015: a edição de seis decretos de liberação de crédito sem autorização do Congresso e às chamadas pedaladas fiscais, situações em que ele e o governo negam haver irregularidade. Cardozo promete recorrer à Justiça contra qualquer acréscimo, como o escândalo da Petrobras.
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MARACUJÁ
No encerramento de sua fala, deputados a favor e contrários ao impeachment se levantaram em coros de “fora, PT” e “não vai ter golpe”. Antes da presença do ministro, o presidente da comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), mandou distribuir suco de maracujá para “acalmar os nervos” dos deputados.
Um dos mais “agitados” era o deputado Marcelo Aro (PHS-MG), que levou para a comissão um boneco do “pixuleko” – representação de Lula como presidiário.
A comissão deve votar seu parecer até o dia 11. A votação no plenário pode ocorrer no dia 17, um domingo.
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É fato que está na Constituição. Mas se esses pressupostos não forem atendidos, se não houver um atentado à Constituição, um ato imputado ao presidente, uma ação dolosa, se essa ação não for tipificada, a tentativa de impeachment é golpe de Estado, sim
Ministro José Eduardo Cardozo, da AGU