A discussão de mais de três horas ontem no Supremo Tribunal Federal (STF) revela o grau de desespero a que o governo chegou às vésperas da votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff no plenário da Câmara dos Deputados. Será que a ordem de votação dos deputados pode fazer tanta diferença assim?
Para tentar responder à pergunta, fiz algumas simulações na planilha em que acompanho as intenções declaradas de voto dos deputados, conciliando os dados dos primeiros sites a manter levantamentos completos a respeito do voto dos parlamentares: o Placar do Impeachment, do jornal O Estado de S. Paulo e o Mapa do Impeachment, do movimento Vem Pra Rua (em geral os dados têm sido consistentes, mas já encontrei erros em ambos, daí a necessidade de cotejar as informações).
No início desta manhã, estão confirmados 345 votos a favor do impeachment, 128 contra, 1 abstenção e 39 votos indefinidos. Entre os indefinidos, se levarmos em conta que o voto de um deputado sofre influência igual da votação no estado e no partido a que ele pertence, o valor esperado de votos favoráveis é 23. De acordo com esses cálculos, portanto, o impeachment de Dilma conta com 368 votos.
É possível fazer um cálculo mais conservador, levando em conta apenas votos confirmados nos dois levantamentos. Nesse caso, o impeachment tem cravados 329 votos favoráveis, 128contrários e 55 indefinidos. Entre os indefinidos, o valor esperado de favoráveis é 32. Com essa premissa, o impeachment de Dilma conta com 361 votos.
A menos que haja alguma reviravolta de última hora, há pouca dúvida de que o plenário será favorável à sua saída. Qual seria a interferência da ordem de votação no momento em que ela seria impedida, o voto de número 342? É possível, para os dois cenários acima, simular quem seria o deputado responsável pelo voto decisivo e o momento em que esse voto sairia. Para comparar, previ as seguintes situações: chamada por ordem alfabética e chamada pela ordem proposta pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e aprovada pelo STF. Eis os resultados:
Supondo o cenário conservador e a chamada pela ordem aprovada, o voto 342 seria dado pelo deputado José Carlos Aleluia, do DEM da Bahia, o 479.o a votar.
Supondo o cenário conservador e a ordem alfabética, o voto 342 seria dado pelo deputado Thiago Peixoto, do PSD de Goiás, o 472.o a votar.
Supondo o cenário mais generoso e a chamada pela ordem aprovada, o voto 342 seria dado pelo deputado Elmar Nascimento, do DEM da Bahia, o 471.o a votar.
Supondo o cenário mais generoso e a ordem alfabética, o voto 342 seria dado pelo deputado Stefano Aguiar, do PSD de Minas Gerais, o 466.o a votar.
Essas suposições levam em conta que a probabilidade de voto de um deputado é afetada do mesmo modo por seu estado de origem e por seu partido. Mas quaisquer outras premissas não trariam resultados muito diferentes. O voto decisivo se dará na porção final da votação, provavelmente quando estiver votando a bancada da Bahia, mesmo no cenário mais conservador. Estará provavelmente entre os votos de número 471 e 479. Se houver uma manada de votos a favor, pode acontecer um pouco antes, mas não muito.
A ordem de votação terá, portanto, uma influência mínima sobre o momento do voto decisivo. Uma vez que não se chamem primeiro todos os deputados de estados majoritariamente favoráveis ao impeachment, o acúmulo de votos será relativamente uniforme, qualquer que seja a ordem de chamada. O STF levou horas ontem discutindo um assunto que não tem a menor relevância. O importante mesmo será a decisão tomada por aqueles cujo voto ainda está indefinido.