O Conselho de Ética atingiu um recorde em 2016: nunca o colegiado demorou tanto para abrir a investigação contra um deputado. Depois de quase quatro meses debruçado sobre o processo contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não foi diferente nesta terça-feira. A sessão terminou, mais uma vez, sem nem sequer avançar na etapa inicial, que é a aprovação da admissibilidade da ação por quebra de decoro. Em meio às manobras protelatórias, houve acusações de que Cunha concede benefícios para aqueles que evitam a sua cassação.
A declaração foi feita pelo deputado José Geraldo (PT-PA). Diante das sucessivas estratégias de aliados de Cunha para atrapalhar a sessão, o petista comparou a organização da conhecida “tropa” do peemedebista à do time de futebol do Barcelona. E questionou a motivação desses parlamentares: “Eu fico me perguntando o que os sustenta tanto. Na verdade, é aquilo que a gente sempre disse: o presidente tem mecanismos, tem ferramentas, tem poder para pagar tudo isso”, afirmou.
Geraldo citou como exemplo a indicação do aliado Manoel Júnior (PMDB-PB) para a presidência da comissão especial que trata da regulamentação de contratos de seguro privado, oficializada nesta terça. “Não chegou lá à toa. É um dos defensores do Eduardo Cunha aqui. Agora ele tem de pagar. Parabéns”, ironizou.
O pronunciamento do petista gerou imediata reação dos aliados de Cunha – e deu a eles justamente o tempo que queriam para protelar a sessão e evitar a votação da admissibilidade, impedida por causa da abertura dos trabalhos em plenário.
Em resposta ao petista, o deputado Manoel Júnior disse ser detentor de oito mandatos e capacitado para assumir o comando da comissão. E atacou José Geraldo, afirmando que ele tem um “cinismo estarrecedor”. “Vossa excelência, com essa sua fala, esquece que foi neste mesmo conselho que disse a mim, no meu ouvido, que ia votar contra o parecer do deputado Fausto Pinato [relator destituído que pediu a investigação contra Cunha]”, acusou. O peemedebista promete ingressar com uma representação contra José Geraldo para ele comprovar o pagamento que ele teria recebido na Câmara.
A votação desta terça-feira foi marcada por uma série de estratégias articuladas por deputados ligados a Cunha. As iniciativas já são conhecidas: vão de reclamações da ata da sessão anterior até a questionamentos alheios ao tema em questão. Nesta tarde, coube ao deputado Wladimir Costa (SD-PA) apresentar uma nota de repúdio direcionada ao presidente do conselho, deputado José Carlos Araújo (PSD-BA). Antes de ler o documento, explicitou o desinteresse em abrir a votação: “Estou sem óculos e irei ler lentamente”, disse, tomando dez minutos para questionar o comando do colegiado. As investidas partiram também dos deputados Carlos Marun (PMDB-MS), Manoel Júnior (PMDB-PB) e André Moura (PSC-SE).
O colegiado conseguiu concluir a etapa da discussão do parecer do deputado Marcos Rogério (PDT-RO), que defende a continuidade das investigações contra Cunha. A sessão foi suspensa e pode ser retomada ainda nesta noite ou na manhã de quarta-feira. Foi apresentado um “kit obstrução” pedindo o adiamento da votação.