Congresso A colegas, deputados dizem temer a forte pressão que envolve o caso
Fabio Murakawa e Raphael Di Cunto
De Brasília
Ficar a cargo da relatoria de um processo que pode levar à cassação do mandato de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente da Câmara mais poderoso em muitos anos e cujo nome foi envolvido no escândalo do Petrolão. A tarefa estará entre José Geraldo (PT-PA), Vinícius Gurgel (PR-AP) e Fausto Pinato (PRB-SP), sorteados entre 16 deputados do Conselho de Ética da Câmara como pré-candidatos a relator do processo aberto contra Cunha pelo PSOL e a Rede no colegiado.
A escolha final é uma prerrogativa do presidente do conselho, José Carlos Araújo (PSD-BA), e será feita hoje. “Quero conversar com os três que foram sorteados. E, a partir daí, quando apresentarem seu plano de trabalho, vou usar a prerrogativa de escolher um dos três”, afirmou Araújo, que, até a noite de ontem, só tinha conversado com um dos sorteados.
Parlamentares avaliavam que a tendência era a escolha de Pinato, do PRB, para evitar um deputado próximo de Cunha – caso de Gurgel- ou do governo – Zé Geraldo, que podería ser pressionado por ambos os lados diante do poder do presidente da Câmara levar ou não adiante o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Ontem, a colegas, Geraldo, Gurgel e Pinato afirmaram que estão com pouco entusiasmo com a possibilidade de serem escolhidos. Nas conversas, citaram o excesso de “pressão” a que seriam submetidos ao ficar a cargo do processo contra Cunhaque, diz-se, exerce sobre um número de deputados maior do que qualquer bancada.
Logo após ter o nome sorteado, no início da tarde de ontem, Geraldo não conseguia disfarçar a jornalistas o desconforto com a possibilidade de assumir a relatoria. Ele foi questionado sobre a suposta orientação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que o partido não pegasse pesado com Cunha por causa do impeachment
Na entrevista coletiva, disse que trabalharia com “os fatos” e que viu “fortes indícios” contra Cunha. “Temos que agir com isenção, fazer o nosso trabalho. Vou agir como integrantes da comissão têm que agir. Vocês sabem, tem indícios fortes. Se eu for escolhido, vou me debruçar sobre essa dura tarefa”, afirmou. Mas depois, a um colega do conselho, não escondeu o desconforto e disse que “alguém do PT não seria uma boa escolha”.
Já no caso de Vinícius Gurgel, do PR, a pressão seria grande devido à sua ligação com o presidente da Câmara. Ele foi um dos mais ativos deputados na campanha que conduziu Cunha ao cargo. Nas fotos do dia da vitória de Cunha, Gurgel aparece vibrando em várias fotografias ao lado do presidente da Câmara. “Ele é ultraligado ao Cunha. Imagina a pressão que ele sofreria”, afirmou um colega.
Em seu segundo mandato, o deputado teve uma atuação discreta na Câmara até aqui. Migrou do PRTB para o PR para aumentar suas chances de reeleição. Foi um dos jovens deputados a quem Cunha prometeu ajudar a ascender dentro da Casa durante seu mandato na Presidência.
Ontem, porém, Gurgel foi questionado por jornalistas se há elementos para declarar a inépcia do processo, o que podería levar ao seu arquivamento. “Na minha opinião, não”, respondeu.
Advogado, Pinato está no primeiro mandato de deputado federal e não teria, em tese, ligação forte nem com o governo nem com Cunha-apesar de o PRB ser aliado ao pemedebísta e ao governo. A um colega que lhe perguntou se estava preparado para a tarefa, Pinato respondeu que não pediu para ser relator, mas também “não vou pedir para sair”.
O escolhido terá dez dias para preparar um relatório preliminar, em que decidirá pela admissibilidade ou a inépcia do processo. Se o processo for admitido, Cunha terá, então, outros dez dias para apresentar sua defesa. O regimento da Casa prevê que o processo tem 90 dias para ser concluído. Mas Araújo disse na semana passada que pretende que isso ocorra antes do início do recesso parlamentar, em 22 de dezembro – algo que poucos acreditam que será possível.
Cunha negou-se a comentar sobre os candidatos a relator e voltou a negar ter mentido na CPI da Petrobras, quando disse não ter contas bancárias na Suíça-um dos fatos que motivaram a abertura de processo contra ele. “Eu já falei sobre isso. Eu não menti à CPI. Sobre isso fala o meu advogado. Quando eu apresentar minha defesa lá no Conselho de Ética, vocês vão saber todas as minhas respostas”, disse.
Ontem, Betinho Gomes (PE) e Nelson Marchezan Júnior (RS), os dois integrantes do PSDB no Conselho, negaram a possibilidade de deixarem o órgão para que o partido indique parlamentares alinhados com Cunha, como vinha sendo especulado. “Só tem duas formas de saída do conselho: ou renúncia ou morte e doença. Nenhuma dessas possibilidades está em pauta”, afirmou Betinho.