O vice-presidente Michel Temer já tem uma lista de “notáveis” para integrar ou colaborar com um governo de transição se houver impeachment Luís Artur Nogueira
Do dia 15 de março, quando a agenda oficial previa “despacho interno” no Palácio do Jaburu, sua residência oficial, até o dia 22, o vice-presidente da República, Michel Temer, esteve “sem compromisso oficial”. Temer decidiu permanecer uma semana em São Paulo, a mil quilômetros de distância da crise política, em Brasília. Engana-se, no entanto, quem imagina que o peemedebista tenha ficado alheio aos últimos acontecimentos envolvendo a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, que ainda trava uma batalha jurídica no Supremo Tribunal Federal para assumir a Casa Civil. “Se somarem os cafezinhos e as ligações telefônicas, o dia do Michel tem mais de 24 horas”, brinca um parlamentar que conhece bem o perfil do políticopaulista que comandará o País em caso de aprovação do processo de impeachment de Dilma, pelo Congresso. Embora tenha evitado emitir sinais de que esteja articulando nos bastidores, Temer já tem pronta uma lista de nomes, os chamados “notáveis”, que podem compor sua equipe num governo suprapartidário de transição.
As negociações com os partidos de oposição estão a pleno vapor. Na semana passada, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) revelou um encontro com Temer, na capital paulista, para debater uma “agenda emergencial para o Brasil”. Os tucanos têm batido na tecla de que não pretendem negociar cargos e apenas querem colaborar com propostas. Na segunda-feira 21, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, o senador José Serra (PSDB-SP) avaliou que se Temer assumir, “haverá a necessidade do compromisso de ele não disputar a reeleição”, em 2018. Além disso, o senador afirmou que “o PSDB será chamado e terá a obrigação de participar” do novo governo. As declarações de Serra, que é sempre lembrado por sua afinidade com Temer, acabaram causando mal estar no PMDB e no seu próprio partido. Em nota, no mesmo dia, o vice-presidente da República afirmou que “não tem porta-voz, não discute cenários políticos para futuro governo e não delegou a ninguém o anúncio de decisões sobre sua vida pública”. Nos dias seguintes, no entanto, os cafezinhos e os telefonemas continuaram na sua atribulada agenda informal.
Enquanto o clima político esquenta no Congresso e a presidente Dilma rejeita a renúncia e luta contra o impeachment, Temer já tem pronta uma base do plano econômico do seu eventual governo. Trata-se do documento “Uma ponte para o futuro”, elaborado pela Fundação Ulysses Guimarães. Com 19 páginas, propõe atacar o desequilíbrio fiscal, com limites aos gastos públicos e adoção de idade mínima para aposentadoria, além de propiciar as condições para um protagonismo da iniciativa privada.
Do grupo de economistas que vêm assessorando informalmente o vice-presidente, faz parte o ex-ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto. Nas últimas semanas, Delfim, que tem bom trânsito no governo petista, tem disparado críticas às ideias econômicas do partido. “O programa do PT é produto do pensamento mágico”, afirma o ex-ministro. “Aquele pensamento que acha que dois mais dois, se você ajoelhar e for politicamente forte, vira seis.” O mineiro Roberto Brant, que foi ministro da Previdência no governo Fernando Henrique Cardoso, também colabora com o plano econômico de Temer e pode fazer parte de sua equipe ministerial.
Quem terá assento cativo num governo do PMDB é o ex-ministro da Secretaria da Aviação Civil e ex-governador do Rio de Janeiro, Wellington Moreira Franco, que preside a Fundação Ulysses Guimarães. Na manhã da segunda-feira 21, Moreira Franco proferiu uma palestra a empresários e políticos na sede da Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Dias antes, a entidade havia anunciado seu apoio ao impeachment da presidente Dilma. A pedido de Temer, no entanto, o ex-ministro evitou cravar antecipadamente o desembarque oficial do PMDB do governo federal, que será definido no dia 29 deste mês, numa convenção nacional. No campo econômico, no entanto, Moreira Franco bombardeou a atual política econômica. “Se as quatro operações da aritmética – somar, multiplicar, dividir e subtrair – não são utilizadas, não dá certo”, afirmou o piauiense, que fez carreira política no Rio de Janeiro. Ao defender o documento “Uma ponte para o futuro”, ele afirmou que os peemedebistas “não pretendem criar uma nova matriz econômica”, em alusão ao fracassado plano do governo petista.
Outros nomes com perfil monetarista apontados como conselheiros do vice-presidente da República são Armínio Fraga, presidente do Banco Central no segundo mandato de FHC, e Marcos Lisboa, secretário de política econômica do Ministério da Fazenda no primeiro governo Lula. Ambos descartam participar ativamente de um eventual governo Temer, que conta com o apoio do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf. O empresário vem liderando uma marcha pró-impeachment com adesões cada vez mais numerosas do setor produtivo. Outro nome forte para conduzir o Ministério da Fazenda é o de Henrique Meirelles, que foi presidente do Banco Central no governo Lula. Meirelles é muito respeitado pelo mercado e daria um banho de credibilidade ao governo de transição.
Apesar de ser apontado como um grande articulador político, Temer não abre mão do auxílio dos experientes ex-ministros Eliseu Padilha e Geddel Vieira Lima, e do jovem deputado federal Baleia Rossi (PMDB-SP) para aglutinar forças no Congresso Nacional. Já o senador Romero Jucá (PMDB-RR) faz a interface com o mercado financeiro. Além de assumir o compromisso de não se candidatar em 2018, Temer não pode errar na montagem do governo de transição. “Com toda a experiência política que tem, Temer vai procurar cercar-se do que há de melhor no País”, diz o deputado federal Heráclito Fortes (PSB-PI). Pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, o deputado federal Indio da Costa (PSD-RJ) concorda: “Michel vai montar um governo de notáveis, com capacidade empreendedora para contribuir com essa travessia.”
Os políticos avaliam que, a exemplo do ex-presidente Itamar Franco, que herdou a faixa presidencial após o impeachment de Fernando Collor, Temer terá a oportunidade de deixar o seu legado, viabilizando reformas polêmicas, como a da previdência. “Além de mudar o governo, é preciso uma mudança de estrutura na administração pública brasileira”, diz o ex-senador catarinense Jorge Bornhausen, que acredita no apoio dos parlamentares. “O Congresso é uma caixa de ressonância da sociedade.” Já o ex-senador José Jorge, que integrou o mesmopartido de Bornhausen, o então PFL (atual DEM), lembra que os derrotados, em caso de impeachment, vão espernear. “O pessoal do PT vai tentar tumultar, mas a população, em si, vai apostar no novo governo para sair da crise”, diz Jorge. Político hábil, Temer estará, no dia 29, em Portugal, a mais de sete mil quilômetros de distância da decisão do PMDB sobe o desembarque do governo.