As manobras de Eduardo Cunha acirram os ânimos no Congresso – e uma briga entre os deputados acaba em pancadaria
Ana Clara Costa
O país assistiu envergonhado às cenas de MMA na Câmara dos Deputados ao longo da semana. Os conditos se acirraram pelas manobras do governo para conseguir apoio (leia mais na página 46) e – principalmente pela atuação belicosa do presidente da Casa, Eduardo Cunha. Em mais uma mostra de seu conhecimento do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, Cunha se valeu do Artigo 7 a para arquitetar a derrubada do deputado Fausto Pinato (PRB-SP) da relatoria do Conselho de Ética. A manobra de Cunha, conduzida por meio da Mesa Diretora da Câmara, baseava-se no argumento de que Pinato integrou o bloco que ajudou a eleger Cunha presidente da Câmara, no início do ano. Por isso, segundo Cunha, Pinato estaria impedido de relatar no Conselho.
A obsessão de Cunha em usar o regimento para justificar movimentações controversas não é novidade. A situação não provocaria uma sequência de pancadaria no Congresso se o objetivo de Cunha não fosse estritamente pessoal. A derrubada de Pinato ocorreu na mesma sessão em que o deputado leu parecer prévio contrário a Cunha no Conselho de Ética, órgão responsável por julgar se o parlamentar quebrou o decoro por mentir à CPI da Petrobras, quando disse que não possuía contas na Suíça. Daí por diante, os fatos vistos no Plenário da Câmara entraram para aquele capítulo da história que os brasileiros não terão prazer em recordar.
Cunha tentou disfarçar, mas, pela sequência de fatos, ficou claro que a artilharia contra Pinato levava sua assinatura. Tudo começou com um requerimento protocolado pelo deputado Manoel Junior (PMDB-PB) fundamentado na premissa de que, por ter feito parte do mesmo bloco que Cunha, Pinato estaria impedido de analisar um processo que pudesse prejudicá-lo. O uso do artigo abre espaço para a contradição porque o partido de Pinato, o PRB, deixou de integrar o bloco do presidente da Câmara. Aliado de Cunha, Manoel Junior tentou protocolar o documento no próprio Conselho, mas o argumento foi rejeitado pelo presidente José Carlos Araújo (PSD-BA) justamente pela contradição. O pedido foi então direcionado à Mesa Diretora da presidência da Câmara. O vice-presidente Waldir Maranhão (PP-MA) acatou o pedido imediatamente e determinou que Pinato fosse destituído. A decisão foi comunicada por Araújo durante a sessão do Conselho, provocando tumulto. Araújo reagiu: “Não posso aceitar de bom grado essa decisão. Acho que é golpe! Não somos meninos de escola. Somos deputados representando a população”, disse.
Diante da queda de Pinato, José Carlos Araújo definiu Zé Geraldo (PT-PA) como novo relator. Zé Geraldo foi um dos três petistas que recuaram no voto favorável ao presidente da Câmara na última semana. A mudança de voto foi o gatilho para que Cunha deflagrasse o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, no último dia 2. Manoel Junior intercedeu novamente em favor de Cunha. Apresentou uma questão de ordem ao Conselho afirmando que a escolha do novo relator deveria ser feita por meio de votação. Araújo acatou e sorteou uma lista tríplice composta por Léo de Brito (PT-AC), Marcos Rogério (PDT-RO) e Sérgio Brito (PSD-BA). Nenhum dos três faz parte da tropa de choque de Cunha. Marcos Rogério foi o eleito.
Na quarta-feira, com os ânimos dos membros do Conselho à flor da pele diante dos rumores de destituição do novo relator, o deputado Paulo Azi (DEM-BA) atrasou-se para a votação de um requerimento que pedia o adiamento da apresentação do parecer preliminar de Pinato. Azi pediu ao presidente que pudesse votar. O pedido foi acatado e deu origem a xingamentos por parte dos aliados de Cunha. “Ele já fechou”, berrava Carlos Marun (PMDB-MS). O voto de Azi, contrário ao não adiamento, decretou o empate. José Carlos Araújo teve de usar o voto de minerva – decidindo pelo não adiamento. Mais berros se seguiram. Na quinta-feira, os nervos não haviam se acalmado. Zé Geraldo e Wellington Roberto (PR-PB) chegaram às vias de fato e partiram para a agressão, trocando tapas. Tiveram de ser apartados por parlamentares e seguranças. Mesmo assim, continuaram o bate-boca: “Você que me meteu a mão”, disse Roberto. “Meti coisa nenhuma”, afirmou Geraldo.
Antes de ser deposto do Conselho, Pinato disse que sofreu ameaças por telefone e por pessoas que o abordaram na rua. Afirmou ainda ter requerido proteção policial, por temer pela segurança de sua família. Em entrevista à Folha de S.Paulo, na sexta-feira, Pinato disse ter sido abordado por um estranho que lhe sinalizou a oferta de dinheiro por meio de gestos com a mão. Pinato disse que o estranho gesticulou e afirmou: “Pensa bem, você pode arrumar tua vida”. Pinato negou que tenha recebido oferta de parlamentares. “Não chegaram a ser tão incisivos. Até porque alguns são meus amigos”, afirmou. Pinato reiterou os episódios a ÉPOCA, por meio de sua assessoria de imprensa. Já a assessoria de Cunha negou que tenha havido manobras no Conselho de Ética. O clima continua tenso. Depois de derrubar o relator, Cunha pediu, em ofício ao ministro José Eduardo Cardozo, que a Polícia Federal abra um inquérito para investigar as acusações de Pinato.