Por mais de oito dias consecutivos milhões de pessoas foram às ruas no País manifestar insatisfação com a qualidade do transporte público, da saúde, da educação e protestar contra a carestia, a corrupção, os desmandos, os descasos, a PEC da Impunidade e os gastos com os estádios para a Copa de 2014.
Depois de mais de 20 anos da mobilização popular pelo impeachment do ex-presidente Collor, a nova geração de caras pintadas tomou conta das praças e logradouros públicos para chamar atenção da volta da inflação e da disparada dos custos dos alimentos. O preço dos produtos in natura cresceu 53% nos últimos 12 meses (Amir Khair em O Estado de S. Paulo, 21/06). O feijão, além de ter produção reduzida em 7%, subiu 20% em um ano (Washington Novaes em O Estado de São Paulo, 21/06). Esse é um dos aspectos mais candentes nos protestos, mas não os únicos.
A situação do transporte foi a crônica da crise anunciada, o estopim das manifestações, enquanto o governo dormia em berço esplendido acreditando que a simples redução de impostos ao setor resolveria o problema, não da precariedade do transporte público, mas da inflação que persiste e resiste. Errou duas vezes.
A tarifa de ônibus aumentou mais que a inflação – reajuste médio de 64% no acumulado de junho de 2005 a junho de 2013 – em 75% das 16 cidades com mais de 1 milhão de habitantes. O Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) no mesmo período ficou em 50% (Valor Econômico, 18/06). Era uma ação voltada para conter a subida da passagem que se esperava e não o menor reajuste que foi permitido às empresas com a desoneração pura e simples de impostos.
Sem uma política nacional de transporte público não há como garantir qualidade ao serviço. Felizmente parece que o governo entendeu esse recado das ruas e a presidente Dilma Rousseff anunciou em cadeia nacional, no dia 21, que vai formular um programa de transporte em parceria com os governos estaduais e prefeitos das capitais.
O que também gera insatisfação e insegurança é o fato de o governo continuar dando sinais contraditórios em relação à política econômica. Digo isso porque ao mesmo tempo em que se mostra disposto a apertar os gastos públicos e diminuir os estímulos ao consumo, lançou, na primeira quinzena de junho, outro pacote de incentivo de R$ 18 bilhões para turbinar o Minha Casa, Minha Vida, que está mais para “Minha Reeleição, Meu Voto”, agora para compra de eletrodomésticos. Só em isenções de impostos para a compra de carros abrimos mão de R$ 30 bilhões desde 2008 (Correio Braziliense, 21/06).
As isenções tributárias aos diversos setores da economia devem bater a soma de R$ 170 bilhões este ano, de acordo com estimativas da própria Receita Federal (Folha de S. Paulo, 21/06). A cortesia com o chapéu alheio está empobrecendo perigosamente prefeituras e estados.
Outro combustível dos protestos, o valor das obras da Copa aumenta a cada parcial na medida em que as construções dos estádios para a competição vão sendo concluídas. O gasto era de R$ 25,5 bilhões em abril e já chega a R$ 28 bilhões, uma diferença bastante significativa, de R$ 2,5 bilhões, ou 9,8% (O Globo, 19/06).
As incertezas quanto aos rumos da economia e a omissão na solução de antigos problemas estruturais levaram multidões às ruas em mais de uma centena de cidades para protestar contra o descaso no transporte, na saúde, na educação e na escalada da violência.
O novo na onda das manifestações é a forma da mobilização, pelas redes sociais, sem projetos políticos claros ou definidos, e a negação da política, dos partidos, dos políticos. A opção do movimento pela política não institucional é um caminho arriscado. Sem partidos não há democracia.
Ao Congresso Nacional cabe resgatar o seu papel de legislador e fiscal interpretando o recado das ruas e construir pontes para recuperar a boa política, que é essencial para o exercício da democracia. A reorientação da política é uma tarefa que precisa ser assumida pelo Parlamento em sintonia com o governo e com o povo. É um bom momento para recuperarmos as reformas estruturais – política, tributária, previdenciária – e o valor da ética, que foi esquecida e aviltada.
Rubens Moreira Mendes Filho é deputado federal pelo PSD-RO e ex-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
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