O Globo Online: Relator da comissão rebate Cardozo, que vê prejudicado direito de defesa de Dilma

Parecer a favor do afastamento de Dilma será aprovado e seguirá para o plenário

BRASÍLIA – A Comissão do Impeachment começou às 10h56 desta segunda-feira a sessão que vai votar o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO) pelo afastamento da presidente Dilma Rousseff. Durante sua exposição, o relator rebateu as críticas do ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, que, na semana passada, classificou o voto pelo impeachment de “nulo”. Logo após a fala de Jovair, Cardozo iniciou a defesa da presidente Dilma Rousseff e reafirmou que o direito de defesa da presidente Dilma Rousseff nesse colegiado foi prejudicado, que houve transgressão da Constituição e voltou a acusar que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), autorizou a abertura do processo de afastamento por vingança. O ministro acusou o relator de ter um “incontido desejo político” de afastar Dilma.

Cardozo disse que o relator excedeu ao citar no relatório Lava-Jato e outras questões envolvendo a Petrobras, que não estavam no pedido de impeachment aceito por Cunha.

– Foi engenhosa a construção do relator. A decisão do despacho indeferiu aspectos. Mas achou que num processo de impeachment pode discutir tudo. Não tem o menor fundamento. Ninguém pode se defender de algo que não pode ser acusado. Vossa Excelência defendeu essa tese. Por que fez isso? Para justificar o que ocorreu ao longo do processo. ‘Só vou analisar, mas deixa o pessoal falar o que quiser. De Lava-Jato.’ Há uma ofensa clara ao poder de defesa – disse Cardozo.

O ministro queixou-se também de a defesa ter sido impedida de fazer perguntas aos três juristas que apresentaram a denúncia na comissão e reafirmou que o parecer é nulo.

– Foi uma transgressão cabal da Constituição. É nulo o parecer, o processo. O amplo direito de defesa e o devido processo legal foram atacados – disse Cardozo antes de ser interrompido por um bate-boca entre parlamentares.

– O raciocínio que foi fio condutor do relatório é: na dúvida, que se aceite a denúncia, que se afaste, na dúvida, que se investigue, que se apure, mas na dúvida não se abre processo que tem uma sanção gravíssima de afastar uma presidente da República.

Cardozo rebateu também o mérito das acusações. Sobre os decreto de crédito afirmou que ao longo de 15 anos da vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal a prática foi adotada tanto no governo federal quanto nos estados e municípios. Ressaltou que só em outubro de 2015 o tema foi abordado pelo TCU.

– Onde está a má-fé, se durante 15 anos se realizou isso sem contestação? Depois que TCU mudou de opinião ninguém mais baixou decreto. Seria a mesma coisa de em uma rodovia haver um limite de velocidade de 80 km, aí se reduzisse para 60 km e todos que andaram no último ano acima de 60 km serão multados – afirmou.

Sobre as pedaladas, Cardozo reiterou não se tratar de operação de crédito. Ressaltou ainda não haver ato direto no caso abordado, que trata do Plano Safra em 2015. Nesse caso, segundo a defesa a decisão é do ministro da Fazenda e do Conselho Monetário Nacional.

‘GOLPE DE ABRIL DE 2016’

O ministro Cardozo, no final da defesa, disse que a História não perdoa violência na democracia e afirmou que assim será compreendido se o impeachment for aprovado. E que será conhecido como o “golpe de abril de 2016”. Cardozo atacou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e, sem citá-lo, disse que há uma “mão invisível, ou visível” por trás do relatório de Jovair Arantes.

– É um absurdo que uma presidente da República seja afastada por uma questão contábil, aceita pelos tribunais, e sem ter se locupletado de um centavo sequer. Isto é absolutamente contrário à Constituição. A História não perdoa a violência na democracia, especialmente em um povo que lutou para tê-la. Esse relatório mostra que não há base constitucional ou legal para o impeachment. Por isso, se consumado, será o golpe de abril de 2016 – disse Cardozo.

O ministro disse que o voto de Jovair Arantes não tem consistência e não pode afastar uma presidente legitimamente eleita. E atacou Cunha.

– Defendo que esse processo foi instaurado com desvio de poder e por meio de uma mão invisível, ou talvez visível de alguém que faz certos processos andarem muito rápidos e outros não andem – disse.

PAINEL ELETRÔNICO

O presidente da comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), respondeu a questionamentos regimentais. Ele decidiu que a votação será no painel eletrônico e não por chamada nominal. Confirmou ainda a manutenção da regra de suplência por bloco. Assim, o deputado Laudívio Carvalho (SD-MG) votará no lugar de Washington Reis (PMDB-RJ), que faltará devido ao fato de estar internado no Rio com suspeita da gripe H1N1. O mesmo ocorrerá no caso da ausência de outros deputados.

Rosso, que ainda não anunciou seu voto, rejeitou questão de ordem apresentada antes que visava impedir o uso por ele de “voto de Minerva” caso a disputa termine empatada.

RELATOR VÊ ALTA GRAVIDADE

Durante sua fala, Arantes afirmou que chamar de nulo seu texto é falta de argumento e disse ainda que os atos realizados pela presidente, como as ‘pedaladas fiscais’, são de elevada gravidade e disse que seu voto foi elogiado por juristas e editoriais de jornais

– São de elevada gravidade (as denúncias contra Dilma). E meu parecer não é nulo. Nulo são os argumentos que sustentam essa tese. É argumento de quem não tem argumento. Atacam a forma e esquecem o conteúdo. Meu relatório foi elogiado por editoriais de jornais, por economistas, por técnicos e juristas. Não li uma única crítica contra meu parecer – disse Jovair Arantes.

O relator afirmou ainda que teve sua independência e idoneidade atacadas e que, sem argumento sólido, atacaram o autor e não o seu texto. Ele também rebateu as críticas de que seu relatório foi feito em conjunto com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), adversário político de Dilma.

– Meu relatório é minucioso, coerente, sensato e cuidadoso (…). Para os desavisados, quem guiou esse relatório foi a Constituição, a Lei de Responsabilidade, a Lei Orçamentária e jurisprudência do Supremo (STF).

PRESIDENTE LAMENTA MURO

Há maioria na comissão para aprovar o texto. Após a decisão da comissão, o parecer seguirá para o plenário, onde é preciso 342 votos para aprovar a admissibilidade do processo, que irá para o Senado.

O presidente da comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), iniciou os trabalhos lamentando a construção do muro separando a Esplanada para as manifestações durante a votação do processo em plenário, prevista para o próximo final de semana.

– Moro em Brasília há 47 anos e me deparei hoje com um muro que foi construído em frente ao Congresso Nacional, um muro que vai do Congresso, atravessando a Esplanada, e indo até a rodoviária. Se pensarmos na simbologia, vale aquela citação de que cada vez que se ergue um muro se separa o povo. Esse não é momento de dividir o país ainda mais, de construir muros. É o momento de deixar disputas de lado para que ao final desse processo possamos nos unir para superar as crises que assolam o país – disse Rosso.

Ele afirmou que o Brasil é conhecido internacionalmente por conseguir superar seus problemas internos “sem guerra ou conflito civil”. Fez comparações com a situação de 1992 e encerrou sua fala lendo a Oração de São Francisco de Assis.

Após a fala de Jovair será aberta a palavra ao advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo. Após a fala do ministro, será aberto espaço para tratar de assuntos regimentais, as chamadas questões de ordem.

Depois disso tudo é que começa o processo de votação com o encaminhamento e a fala dos líderes, de acordo com o tamanho das bancadas. A previsão é que a decisão ocorra no início da noite.

A sessão foi precedida por uma “corrida” dos suplentes na expectativa de votar na comissão. Chegou a haver uma confusão por suposto desrespeito à fila pelo deputado Hildo Rocha (PMDB-MA). O primeiro suplente a registrar presença no bloco do PMDB foi Laudívio Carvalho (SD-MG), que é a favor do impeachment. Ele deve votar no lugar de Washington Reis (PMDB-RJ), que está internado no Rio com suspeita de H1N1.

Eduardo Bresciani e Evandro Éboli

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