O Globo Online: Deputados se retiram do plenário em protesto contra manobra de Cunha

Sessão será reaberta pelo Conselho de Ética /

BRASÍLIA – Após intenso bate-boca e dezenas de pedidos para reabertura da sessão do Conselho de Ética, que vai analisar parecer sobre cassação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), diversos deputados convocaram demais parlamentares para se retirar do plenário da Câmara em protesto contra a decisão do segundo secretário da Mesa, Felipe Bornier (PSD-RJ). Deputados deixaram o Plenário e, aos gritos de “Vergonha! Vergonha! Vergonha!” e “Fora Cunha”, eles então caminharam em direção à galeria das comissões para a sala onde vai se reunir o Conselho de Ética.

O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PSD-BA), reuniu então deputados e prometeu reabrir a sessão que vai analisar o parecer do relator Fausto Pinato (PRB-SP).

– Infelizmente, fomos protagonistas de um episódio que nada engrandece esta Casa. Fico triste, mas não podemos ficar sujeitos às intempéries da Mesa Diretora.

Em uma sessão conturbada no plenário da Câmara, a deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP) em pé na cadeira de rodas, posicionada de frente ao presidente da Câmara, fez um discurso emocionante que calou o plenário. Ela disse que embora goste de Cunha está muito decepcionada.

– Eu gosto do senhor, mas o senhor não está dando exemplo. O senhor está com medo, senhor presidente? Revogue essa decisão e permita a decisão do Conselho de Ética. Eu me retiro do plenário. Levanta desta cadeira Eduardo Cunha – apelou a deputada, comandando a saída de parlamentares da oposição, de partidos independentes e até da base aliada, inclusive de petistas.

O clima é de constrangimento. Outros deputados permaneceram em plenário. O apelo para rever a decisão de Felipe Bornier ( PSD-RJ), que cancelou a sessão do Conselho, foi feita por vários líderes.

– Essa decisão (de cancelar a sessão do Conselho de Ética) deixa o plenário em má posição – disse o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE).

Eduardo Cunha permanece presidindo a sessão enquanto é lido relatório de uma medida provisória em plenário.

A tropa de choque do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), com o apoio do PT, agiu de forma unida e conseguiu impor a primeira derrota aos que defendem a cassação do peemedebista. Os “cunhistas” utilizaram um arsenal de manobras e acabaram conseguindo o cancelamento da sessão que serviria para o deputado Fausto Pinato (PRB-SP) ler seu relatório sobre a admissibilidade ou não da denúncia contra Cunha.

A reportagem do GLOBO flagrou Júnior, na sala ao lado do plenário, em plena articulação para esvaziar a sessão. Ele tinha em uma das mãos a lista de integrantes do conselho e em outra o celular.

Pouco depois do meio-dia, o segundo secretário, Felipe Bornier (PSD-RJ), outro aliado do presidente, que assumira a condução dos trabalhos no plenário, declarou que a reunião do conselho não tinha validade. Com isso, somente na próxima terça-feira é que Pinato poderá apresentar seu relatório.

A manobra para inviabilizar a sessão do Conselho de Ética começou na noite da quarta-feira. O presidente do órgão, José Carlos Araújo (PSD-BA) não conseguia um plenário para a realização da sessão. Ele chegou a procurar o deputado Paulinho da Força (SDD-SP) para reclamar. Na sala onde deveria ocorrer a reunião estava marcada uma sessão da CPI dos maus tratos a animais.

Paulinho, outro representante da tropa de choque de Cunha, disse que não cabia a eles, amigos do presidente da Câmara, arrumar local para a reunião, mas, sim, ao próprio Araújo.

Pela manhã, embora a sessão estivesse agendada para as 9h30, não havia o quorum mínimo de 11 parlamentares. Somente às 10h22 é que o número foi atingido. Os três representantes do PT, por exemplo – Valmir Pracidelli (SP), Zé Geraldo (PA) e Leo de Brito (AC) -, não compareceram. Somente depois de atingido o número mínimo é que os dois primeiros registraram presença. Os suplentes petistas Assis Carvalho (PI) e Odorico Monteiro (CE), que poderiam substituir os titulares, também não estavam presentes.

André Moura (SE), líder do PSD, que não integra o conselho, pediu a suspensão da sessão porque, de acordo com o regimento, decorridos 30 minutos do horário marcado e, não atingindo o número mínimo para abertura dos trabalhos, qualquer deputado pode pedir o encerramento. Mas Araújo afirmou que, como a sala só lhe foi concedida momentos antes do horário marcado, ele teve dificuldades em avisar os membros do conselho e, por isso, o horário que deveria ser considerado era o das 10h, e não o das 9h30.

Quando a sessão foi finalmente aberta, Manoel Júnior (PMDB-PB) passou a uma série de questionamentos. Primeiro, pediu para ler a ata da reunião anterior – o que não é praxe. Ao ser informado que o documento não estava pronto, ele anunciou que a sessão deveria ser encerrada. Como Araújo se negou, Manoel adiantou que recorreria ao plenário. Depois, ele questionou a participação de Júlio Delgado (PSB-MG), que teria defendido a cassação de Cunha. Coube a Betinho Gomes (PSDB-PE) devolver o questionamento, argumentando que, se essa lógica valesse para Delgado, deveria ser aplicada também para Paulinho da Força, que já havia declarado várias vezes que votaria a favor do presidente da Câmara.

Pouco mais de 20 minutos do início dos trabalho no conselho, Araújo foi informado por Paulinho da Força que Cunha, mesmo sem ter o número mínimo, abrira a sessão da Câmara. Ele pediu, então, que Araújo encerrasse os trabalhos, o que não foi atendido. O presidente do conselho lembrou que os membros não iriam deliberar nada e que, portanto, não estariam descumprindo o regimento.

– Assim que a ordem do dia começou eu não posso deliberar e não o farei. Sequer vou ler o relatório do deputado Pinato. Vou suspender a sessão e volto depois – anunciou Araújo.

Mas no plenário, Manoel voltou a carga e questionou a sessão do Conselho. O deputado Luiz Sérgio (PT-RJ) saiu em defesa de Cunha. Ele afirmou que o conselho não podia ter funcionado porque haviam decorridos 30 minutos do início dos trabalhos sem quórum. Depois, o petista tentou justificar a atitude do PT.

– O presidente do Conselho de Ética fez confusão. Um processo extremamente sensível não pode ter margem a questionamentos. Ele pode até tentar começar a sessão mais tarde, mas certamente não terá quórum, porque todo mundo vai embora – disse ele.

O segundo secretário da Mesa Diretora, Felipe Bornier (PSD-RJ), que substituiu Cunha momentaneamente na presidência da Câmara, declarou que a sessão do conselho estava encerrada, o que gerou bate-boca em plenário. O PSDB pediu, então, o encerramento dos trabalhos e disse que partiria para a obstrução. O líder do DEM, Mendonça Filho (PE), pediu que Cunha reconsiderasse a decisão de Bornier, mas o peemedebista não cedeu.

O regimento Interno prevê que 10% dos deputados (52) podem recorrer das decisões do plenário. Lideranças do PPS, PSDB, DEM e outros partidos subscreveram o pedido, mas Cunha desconsiderou.

– O momento de recorrer já passou.

Isabel Braga, Evandro Éboli, Chico de Góis e Letícia Fernandes

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