A BATALHA DO IMPEACHMENT
Henrique Alves, do PMDB, pede demissão do Turismo; PSD libera voto da bancada sobre afastamento
De saída. Alves e Temer na posse do ex-presidente da Câmara no Ministério do Turismo, ano passado: diálogo entre governo e PMDB “se exauriu”, disse na carta de demissão
Silvia Amorim, Isabel Braga, Simone Iglesias e Catarina Alencastro
Às vésperas do rompimento do PMDB, marcado para hoje, o governo sofreu ontem dois novos golpes que revelam o agravamento da crise política: o ministro Gilberto Kassab (Cidades) admitiu publicamente ter liberado a bancada do PSD para votar livremente sobre o impeachment; e o ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, entregou no fim da tarde sua carta de demissão, justamente quando o Planalto fazia esforço para manter a fidelidade dos sete ministros peemedebistas em defesa do mandato da presidente Dilma Rousseff.
Com 31 deputados, o PSD começou a dar os primeiros passos concretos para se afastar do PT e da presidente às voltas com um impeachment. Esse movimento envolveu ações costuradas em Brasília e São Paulo, que ganharam corpo nos últimos dias. Em São Paulo, onde ontem à noite participou de um evento na Assembléia Legislativa, Kassab admitiu que cada um dos deputados de sua bancada votará como quiser e, por isso, negou a existência de um racha na legenda quando indagado qual seria a voz majoritária dentro do partido, se a favor ou contra o governo.
– Não existe racha. Em partido que libera não existe racha. O PSD é um partido unido em cima de propostas claras para o país. Em algumas circunstâncias entende que, até pela razão de serpartido novo, precisa da liberação (da bancada) para que cada um tenha o conforto de votar de acordo com a sua história – disse Kassab.
A decisão foi tomada semana passada, logo depois que o partido permitiu que um de seus parlamentares, Rogério Rosso (PSD-DF), assumisse a presidência da comissão especial do impeachment na Câmara.
O partido ocupa desde dezembro de 2014 o Ministério das Cidades, um dos mais cobiçados da Esplanada. Mas lideranças do PSD dizem que não há condições políticas para o partido impor uma postura em favor do governo a seus parlamentares. Nas contas de dirigentes da sigla, ao menos metade da bancada apoia hoje o impeachment de Dilma.
– Os parlamentares estão sofrendo uma pressão muito grande de suas bases. Eles sabem que dependem dessas bases nas eleições, e neste momento fica difícil ir contra o que elas pedem – explicou uma liderança do PSD sobre o movimento pró-impeachment.
Diferentemente do PMDB, que marcou para hoje uma reunião para anunciar uma posição oficial sobre o afastamento do governo, o PSD não tem reuniões marcadas para isso. O ministro das Cidades, Gilberto Kassab, fundador do PSD, vinha evitando falar publicamente sobre o futuro da sigla. Por isso, o desembarque oficial do governo pelo PSD ainda é considerado algo remoto por lideranças da legenda.
Em São Paulo, uma outra frente que converge para os interesses do PSD de se descolar aos poucos do governo Dilma e do PT deverá ser oficializada nos próximos dias. O PSD terá uma candidatura a prefeito de São Paulo de oposição ao PT. Até pouco tempo atrás, Kassab estava costurando uma candidatura neutra na maior cidade do país com o candidato Ricardo Patah. Nos últimos dias, o ministro tem acertado com o ex-tucano Andréa Matarazzo os detalhes finais da filiação dele ao PSD para sair candidato a prefeito de São Paulo.
– É tudo uma coisa só. São movimentos que indicam a forte tendência de afastamento do PSD do PT – afirmou uma liderança paulista do PSD.
NOMEAÇÃO DE ALVES CONTRARIOU RENAN
No PMDB, o apoio ao governo está em franca e explícita deterioração. Ministro mais próximo do vice-presidente Michel Temer, o peemedebista Henrique Eduardo Alves (Turismo) pediu demissão do cargo no fim da tarde de ontem, em carta endereçada à presidente Dilma Rousseff. Há menos de um ano no comando da pasta, Alves se tornou ministro na “cota pessoal” de Temer em abril de 2015, quando Dilma resolveu agradar ao vice e se indispôs com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Alves assumiu no lugar de Vinícius Lages, afilhado político de Renan. A troca de ministros, à época, foi vista como gesto equivocado de Dilma, que comprava briga com um dos seus principais fiadores no Congresso. Assim que Lages foi demitido, Renan pôs em votação no Senado projeto que tinha forte resistência do Planalto: a mudança de indexador das dívidas dos estados e municípios com a União, que recalculou para menos os débitos.
Antes de entregar a carta no Palácio do Planalto, Henrique Alves conversou com Temer. Pesou na decisão a relação com o vice e os 46 anos de filiação ao PMDB. Entre os peemedebistas próximos a Temer, a permanência de Alves vinha causando mal-estar, pela iminência do desembarque. Ontem, na véspera da reunião do Diretório Nacional que deverá aprovar por ampla maioria o rompimento com Dilma, Alves decidiu sair.
Na carta entregue à presidente, o peemedebista alega “coerência ideológica” e diz que o diálogo entre governo e PMDB, “infelizmente, se exauriu” “Todos sabem que sempre prezei o diálogo permanente. Diálogo este que, lamento admitir, se exauriu. Assim, presidenta Dilma, é a decisão que tomo. Estou certo de que sendo a senhora alguém que preza acima de tudo a coerência ideológica e a lealdade ao seu próprio partido, entenderá a minha decisão” justifica a demissão em um trecho da carta.
Henrique Alves afirma, ainda, que a decisão ocorre porque seu partido resolveu seguir outro caminho e que deve ficar do lado de Temer, “companheiro de tantas lutas”: “O momento nacional coloca agora o PMDB, meu partido há 46 anos, diante do desafio maior de escolher o seu caminho sob a presidência do meu companheiro de tantas lutas, Michel Temer”.
A reação do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), ao saber da demissão de Alves do Ministério do Turismo, deu o tom de como o governo atuará para reagrupar a base após o desembarque do PMDB:
– Esse ministério do Henrique Alves vai ser ótimo para redistribuir para quem quer ficar com o governo – afirmou ontem o deputado. (Colaborou Júnia Gama)