Reforma administrativa vai extinguir também mais de mil cargos comissionados; decisão surpreende aliados e abre novo foco de tensão
Erich Decat
Daniel Carvalho / Brasília
O anúncio de que a presidente Dilma Rousseff fará uma reforma administrativa, com redução de ministérios e corte de cargos comissionados, pegou integrantes da base do governo no Congresso de surpresa e abriu um novo foco de tensão na já conflagrada relação dos aliados com o Palácio do Planalto. A oposição, por sua vez, criticou o “atraso” da medida.
O principal motivo para a apreensão na base foi a insegurança gerada com a decisão, uma vez que não foram informadas quais serão as pastas e os cargos sob risco de extinção. Por isso, aliados passaram a defender o PT como maior alvo dos cortes, já que se trata do partido com mais pastas na Esplanada. Houve críticas também ao momento do anúncio – mesmo dia em que o vice-presidente Michel Temer deixou a articulação política do governo. Amedida motivou ate o discurso de quem quer deixar a base.
Para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o anúncio serviu apenas para criar um fato político a fim de tentar sobrepor as notícias ruins da área econômica. “Foi um anúncio atabalhoado, porque não tinha uma decisão tomada. Queriam criar um fato político”, afirmou o peemedebista.
Cunha voltou a defender a saída do PMDB dos ministérios que estão sob seu comando. “Todos (os partidos) deveriam entregar (ministérios), todos deveriam reduzir. O PMDB deveria ser o primeiro a entregar todos, não só a redução proporcional, deveria sair da base do governo.”
O partido indicou sete ministros: Minas e Energia, Agricultura, Turismo, Pesca, Aviação Civil, Portos e Assuntos Estratégicos. Além disso, a Secretaria de Relações Institucionais está sob responsabilidade da legenda. “O poder ninguém entrega olimpicamente”, disse ao Estado o titular da Secretaria de Aviação Civil,Eliseu Padilha, braço direito de Temer na articulação política.
Estaca zero. Com a sinalização de que haverá redefinição dos espaços de cada legenda, lideranças da base consideram que voltarão à estaca zero as negociações iniciadas nos últimos meses em tomo das indicações do segundo e terceiros escalões e da liberação de emendas parlamentares.
No Planalto, a explicação para deixar para setembro o anúncio de quais pastas serão extintas é ganhar tempo para a negociação com os afiados e, com isso, tentar reorganizar a base.
Líderes aliados lembram, por sinal, que é preciso antes de tudo definir quem conduzirá as novas rodadas de negociações, uma vez que Temer comunicou ao Planalto que deixará o “varejo” da articulação política e passará a atuar em “grandes temas” e discussões institucionais. O primeiro gesto de afastamento deverá ser concretizado em setembro, quando Temer passará uma semana longe do Congresso, em atividades na Rússia e na Polônia.
Padilha assegura que deixará a atual função na articulação política até setembro, quando Dilma deve concluir os estudos da redução dos ministérios. A ideia é que o ministro se atenha à pasta da Aviação Civil.
“Precisamos aguardar as definições a respeito da coordenação e articulação política do governo para que a base não se desestabilize mais”, afirmou o líder do PSD, Rogério Rosso (DF). O partido pode perder a Secretaria de Micro e Pequenas Empresas, comandada por Guilherme Afif Domingos.
Também estão sob risco outras secretarias com status de ministério, comandadas por PT e PMDB. No caso dos peemedebistas, eles podem perder Assuntos Estratégicos, Portos, além do Ministério da Pesca. Já os petistas podem ter a Secretaria-Geral e a de Direitos Humanas fundidas.
O líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), reconheceu que haverá pressão de afiados para que o partido seja o principal alvo dos cortes. “E uma conta que, para fechar, vai precisar de muita conversa”, disse.
“A gente está disposto a colaborar com a arrumação, mas é importante que (o corte) seja feito em todos os espaços, de todos os partidos”, afirmou o líder do PP, Eduardo da Fonte (PE).
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), admitiu que Dilma “surpreendeu a todos” com o anúncio, mas tentou contemporizar a insegurança dos líderes diante das especulações sobre os cortes. “Vamos abrir o debate. O governo jogou uma grande ideia”, afirmou. “A presidente não está tomando nenhuma decisão de forma autoritária nem impessoal.” Para o presidente do PSDB e candidato derrotado por Dilma na eleição do ano passado, senador Aécio Neves (MG), a presidente “se rendeu ao óbvio” ao anunciar o corte com “injustificado atraso”. “A redução de ministérios e cargos é necessária, mas melhor seria se realizada com convicção, e não por um governo em busca de algum oxigênio para continuar a existir”, criticou Aécio, que lembrou ter defendido a medida na campanha, mas foi contestado pela então candidata à reeleição. / colaboraram DAIENE CARDOSO, RICARDO BRITO e RICARDO GALHARDO