Homero Pereira, deputado federal (PSD-MT) e presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária.
Para escrever este artigo, busquei inspiração num fato histórico de triste lembrança: o famigerado AI-5, imposto à nação por Costa e Silva.
Em 13 de dezembro de 1968, no Palácio do Planalto, a única voz discordante daquela atrocidade foi a do vice-presidente Pedro Aleixo. “Presidente, o problema de uma lei assim não é o senhor nem os que com o senhor governam o país; o problema é o guarda da esquina.”
Infelizmente, a preocupação do político mineiro não impediu que aquele ato fosse assinado. A partir dele, todo o país passou a assistir às injustiças e aos crimes cometidos pelos guardas da esquina.
Pois é, assim como o corajoso Pedro Aleixo, nosso temor com essa Proposta de Emenda Constitucional 438, a PEC do trabalho escravo, é a sua total subjetividade e falta de clareza, deixando sua aplicação ao livre arbítrio não do guarda da esquina, mas dos fiscais ou auditores do Ministério do Trabalho.
Eles, a torto e a direito, saem país adentro com a temida Norma Regulamentadora (NR) 31, com seus 252 itens, elaborada por eles mesmos, a punir prazerosamente qualquer empregador que não observar as incongruências nela contida.
São incontáveis os absurdos da NR 31. Ela prevê, por exemplo, a expropriação do imóvel em construção. O pretendente comprador perde tudo o que desembolsou se o fiscal entender que houve trabalho análogo ao de escravo.
Outra aberração é sobre o transporte dos trabalhadores rurais. No percurso do alojamento até as lavouras, todos os operários devem viajar sentados. Se, por qualquer razão, o fiscal encontrar um trabalhador em pé, isso é trabalho análogo ao de escravo. O proprietário é multado. A fazenda, passível de expropriação.
Esse procedimento não se verifica no transporte urbano. Seriam dois pesos e duas medidas?
A definição de trabalho escravo e degradante é tão genérica, inconsistente e arbitrária que qualquer empregador, urbano ou rural, pode ser multado ou punido ou ter sua propriedade ou indústria expropriada se assim entenderem os fiscais do trabalho. Se a NR 31 fosse cumprida à risca, todos os shoppings seriam fechados no país. Ela exige que para cada 40 empregados a unidade comercial tenha um banheiro próprio. Não se conhece uma loja sequer desses shoppings que tenha no seu interior instalação sanitária.
Esse tema é tão complexo e instigante que o próprio presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro João Oreste Dalazen, cobrou recentemente mais clareza da legislação que trata do trabalho escravo ou análogo. Segundo ele, os termos “jornada exaustiva” e “condições degradantes de trabalho” do artigo 149 do Código Penal são genéricos e dificultam a identificação dos locais onde há trabalho em “condições análogas às de escravo”.
Por razões como essas, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), formada por mais de 200 deputados e senadores, decidiu questionar a PEC 438, acolhendo apelos não só do setor produtivo rural como também da indústria e do comércio.
Nenhum de nós é a favor do trabalho escravo. Nós abominamos essa deplorável situação. Aliás, ninguém em sã consciência pode ser a favor do trabalho escravo. Somos, sim, contra a insegurança jurídica e a subjetividade que tanta inquietação vem trazendo aos empregadores rurais e urbanos.
Por isso, defendemos uma legislação que defina de uma vez por todas trabalho degradante ou análogo ao trabalho escravo.
Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 4 de junho de 2012.