Imprevisibilidade do efeito no Congresso das gravações do ex-presidente da Transpetro com PMDB leva o presidente a fechar pauta para debater ajuste fiscal e reajuste de servidores
Luiz Carlos Azedo
Brasília – Diante de mais uma semana difícil pela frente, em razão das gravações de conversas do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o senador Romero Jucá (PMDB-RR) e o ex-presidente José Sarney, nas quais também foi citado, o presidente em exercício, Michel Temer, pretende enviar uma agenda positiva ao Congresso. No pacote, propostas para combater a violência contra as mulheres e a aprovação da reposição salarial de servidores da União prevista no Orçamento de 2016, que está parada na Câmara.
Temer interrompeu o feriado prolongado já no sábado e retornou a Brasília, quando jantou com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes. O ministro é relator do pedido de cassação da chapa Dilma-Temer apresentado pelo PSDB àquele tribunal, e deve assumir também a presidência da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), responsável pelo julgamento dos envolvidos na Lava-Jato. Eles conversaram sobre a necessidade de liberação de R$ 250 milhões do Ministério do Planejamento para aquisição de 90 mil urnas para as eleições municipais deste ano, segundo nota do TSE.
Ontem, quem almoçou com Temer foi o líder do PSD na Câmara, Rogério Rosso (DF), que visitou o presidente interino no Palácio do Jaburu com a mulher e os filhos. Ambos são amigos e se visitavam com frequência antes do impeachment. Segundo Rosso, o presidente interino estava tranquilo quanto à Operação Lava-Jato e mais preocupado com a situação da economia. “Passou quase uma hora falando do desemprego, principalmente em São Paulo”, disse. “Falamos de credibilidade do país, investidores, equilíbrio fiscal, exportações, competitividade, parcerias e concessões, financiamento da economia produtiva e desburocratização”, explica.
Na conversa com Rosso, outro tema abordado foi o caso da adolescente estuprada no Rio de Janeiro na semana passada. “O presidente pediu ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, para preparar um programa de combate à violência contra a mulher, que pretende enviar ao Congresso ainda nesta semana”, disse Rosso. A reposição salarial dos servidores da União, com grande impacto em Brasília e no Rio de Janeiro, também está na agenda de Temer. Com a revisão da meta fiscal, é possível aprovar as reposições previstas no Orçamento da União, que estavam sendo negociadas pelo Ministério do Planejamento com os sindicatos de servidores.
Essa agenda positiva, porém, pode virar uma pauta bomba no Congresso se as medidas de ajuste fiscal não forem aprovadas pela base do governo, que está desarticulada na Câmara. Na semana passada, a revisão da meta fiscal pelo Congresso levou 16 horas para ser aprovada, não apenas por causa da obstrução feita pelo PT e seus aliados (PCdoB e do PSOL. O líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), teve dificuldades para articular o chamado Centrão (PP, PR, PSD, PRB, PSC, PTB, PSL, PEN, SD, PTN, PHS, Pros e PTdoB) com o PMDB e as siglas da antiga oposição, PSDB, DEM e PPS.
Temer pretende se reunir ainda hoje com o secretário de Governo, Geddel Vieira Lima, e os líderes governistas para discutir a agenda da semana. Segundo o vice-líder do governo Arthur Maia (PPS-BA), o Planalto pretende negociar com os partidos da base a aprovação do ajuste fiscal e melhorar a capacidade de articulação em plenário. “A revisão da meta fiscal contava com o apoio de todos, mas as medidas de ajuste fiscal são mais polêmicas”, explica. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deve enviar ao Congresso, nesta semana, a proposta de teto para crescimento da despesa pública, ao qual estarão vinculados os gastos com saúde e educação. O assunto é polêmico, tanto quanto a fixação de idade mínima para aposentadoria e a desvinculação dos reajustes de aposentados dos aumentos do salário mínimo, também em estudos na nova equipe econômica.
REFORMA O presidente em exercídio precisa explicar ao ministro Luís Roberto Barroso, do STF, até quarta-feira, as razões para a reforma administrativa na formação do governo provisório. Realizada por medida provisória, após o afastamento de Dilma Rousseff que tramita no Senado, incluiu nomeação de ministros, fusão e extinção de pastas e alteração da política externa. A exigência de Barroso foi encaminhada à Presidência devido a uma ação apresentada no último dia 23 pelo PDT, que questionou a mudança de projetos e anulação de atos da presidente afastada. O partido alega que o afastamento de Dilma é temporário (por até 180 dias) e que Temer não poderia mudar o programa de governo da presidente afastada.
Ministro teria ajudado Renan
Novas gravações feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado envolvem o ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Fabiano Silveira. Áudio divulgado ontem pela Rede Globo revela que Silveira se reuniu com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e dois advogados, quando teria orientado ambos sobre as investigações da Procuradoria-Geral da República. Funcionário de carreira do Senado, Fabiano era conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, indicado por Renan, e foi escolhido por Temer para ser ministro. Segundo as gravações, três meses antes de assumir o cargo, Fabiano teria participado de reunião na casa de Renan, onde a Lava-Jato foi amplamente discutida. Durante as tratativas do acordo de delação premiada, Machado disse que em 24 de fevereiro foi à casa de Renan para conversar sobre “as providências que ele estava pensando acerca da Lava-Jato”. Nos áudios, Renan diz estar preocupado com um dos inquéritos a que responde no STF, o que investiga se ele e Machado receberam propina (em forma de doações eleitorais) para facilitar a vitória de um consórcio de empresas em licitação para renovar a frota da Transpetro. Fabiano teria dito que o procurador-geral Rodrigo Janot está perdido. E aconselhado Renan a não dar sua versão a Janot, para dificultar a investigação: “A única ressalva que eu faria é a seguinte: está entregando já a sua versão pros caras da PGR? Eles não terão condição, mas quando você coloca aqui, eles vão querer rebater os detalhes que colocou”. Procurado pela reportagem, Fabiano garantiu que nunca teve relação com Machado. As defesas de Renan e Machado não quiserem comentar as novas gravações.