Comissão especial aprova por 38 votos a 27 o pedido de impeachment da presidente por crime de responsabilidade fiscal. Batalha do Planalto por apoio se intensifica esta semana
Paulo de Tarso Lyra, Marcella Fernandes, Julia Chaib e Naira Trindade
Brasília — O placar final da comissão especial do impeachment — 38 votos favoráveis e 27 contrários ao afastamento da presidente — manteve em aberto a votação decisiva no plenário da Câmara. Aliados do Planalto calculam que, para obter os 342 votos necessários para afastar a presidente Dilma Rousseff, a oposição teria de ter obtido, ontem, ao menos, 43 votos, para que a proporção se repita no fim de semana. Já os oposicionistas apostam em um plenário mais heterogêneo que a comissão montada, segundo eles, “para que o governo não perdesse a primeira batalha do impeachment”.
Proporcionalmente, a oposição obteve pouco mais de 58% dos votos válidos na comissão ontem. A guerra no plenário será mais intensa, já que o processo de Dilma só segue para o Senadose o impeachment for aprovado por dois terços dos deputados. A estratégia passa, também, pela necessidade de um quórum mais elevado. Para se ter uma ideia, parlamentares experientes calculam que, na aprovação de emendas constitucionais por 308 votos, a margem de segurança é de, no mínimo 490 deputados em plenário. Processos de impeachment são aprovados com 342 votos.
Para aliados do vice-presidente Michel Temer, o resultado expressou quase que fielmente os cálculos internos feitos antes da votação. “Foi o melhor resultado entre aqueles que esperávamos conseguir. É bom lembrar que essa comissão foi montada com base nas regras definidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que beneficiavam o Planalto”, disse o deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA).
O tucano estima que a oposição tenha, hoje, aproximadamente 330 votos em plenário, em um universo de 60 parlamentares ainda indecisos. “O resultado demonstra a fragilidade da defesa da presidente da República. Ela cometeu crime de responsabilidade previsto na Constituição e terá a admissibilidade de seu processo de afastamento aprovado, segundo determina a mesma Constituição”, afirmou o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG).
Já o chefe do gabinete da presidente Dilma, ministro Jaques Wagner, que ao lado do ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem sido um dos principais estrategistas para salvar Dilma, também afirmou que o resultado de ontem estava dentro do esperado. “Nossa conta era de 27 a 31, 32. Mas os 27 eram dentro até porque representam 41,5% da comissão. No plenário, daria 213 votos. Em alguns momentos, tenho falado que nossa conta varia entre 207, 208”, calculou Wagner. “Eles pregam o golpe dissimulado e podem comemorar número, mas não dá o resultado que gostariam. Vamos continuar trabalhando até dia da votação em plenário”, afirmou.
Wagner afirmou que a presidente Dilma Rousseff recebeu com tranquilidade o resultado e que “agora é hora de trabalhar”. “Os 27 deputados que considero heróis da democracia porque reconheço mais que defensores governo”, afirmou Jaques Wagner.
QG em hotel O resultado aumenta ainda mais a pressão nos três dias que antecedem o início dos debates do impeachment, previstos para começar na próxima sexta-feira. A oposição seguirá pressionando os indecisos. Mas o vazamento de um áudio ontem (leia mais na página 5) na qual o vice-presidente já discursou como se o impeachment tivesse sido aprovado, pode embolar os planos. “Vamos evitar usar o WhatsApp para divulgar nossa estratégia”, ironizou um aliado do vice-presidente.
Além da batalha pelos votos em plenário, ainda paira no ar o risco da judicialização, já que o advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, apontou uma série de irregularidade que teriam sido cometidas ao longo do processo de impeachment.
O presidente da comissão especial, deputado Rogério Rosso (PSD-DF), defendeu o trabalho do colegiado. “Diferentemente de 1992 (impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello) em que a comissão se reuniu apenas nove horas e não promoveu debates e esclarecimentos, fizemos mais de 50 horas de reuniões e debates, dando oportunidade de ampla defesa a presidente”, afirmou.
Tumulto e bate-boca na última sessão
A última sessão de debates na comissão foi marcada por polêmicas e bate-boca entre aliados e oposição ao Palácio do Planalto. Foram quase 10 horas de discursos inflamados de ambos os lados. Algumas bancadas foram rachadas para a votação. O PMDB, que até o fim de março era o principal aliado do governo e decidiu romper com a presidente Dilma, liberou o voto dos seus deputados diante das divisões internas. O líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), argumentou que a bancada está dividida, por isso, liberaria o voto — e foi aplaudido pelo plenário. Ao fim da votação, deputados oposicionistas foram vaiados por um grupo contrário ao impeachment, formado por assessores parlamentares e servidores da Câmara, que gritavam “não vai ter golpe, vai ter luta” e “golpistas, fascistas, não passarão”. Acompanhados de pessoas pró-impeachment, os parlamentares responderam cantando “fora PT” e “acabou a boquinha”. Houve troca de empurrões e ofensas. (Com agências)