Época online | Idéias: Eduardo Cunha contamina o processo de impeachment?

Na mira da Lava Jato e do Conselho de Ética, o presidente da Câmara luta pela própria sobrevivência. Sua condição interfere no julgamento de Dilma Rousseff?

O documento de defesa da presidente Dilma Rousseff, apresentado na segunda-feira, dia 4 de abril, à comissão do impeachment pelo chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, é um calhamaço de 201 páginas. Nele, o nome de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, responsável por acolher o pedido de impedimento, aparece 53 vezes ou 113 vezes, quando identificado pelo sobrenome Cunha. É mais citado que pedaladas fiscais (seis vezes), principal crime de responsabilidade de que trata a denúncia. É mais citado que Dilma Rousseff (25 vezes) ou Dilma (37 vezes), a presidente que o documento busca defender. A contagem de palavras um critério incompleto, mas bastante objetivo para avaliar o teor de um texto sugere que o principal argumento da AGU contra o impeachment de Dilma não está no que Dilma fez ou deixou de fazer, mas em quem acolheu a denúncia.

Cardozo diz que o julgamento de Dilma é contaminado pelo oportunismo de Cunha. Agiu, sem qualquer pudor, para retaliar a sra. presidenta da República, o seu governo e o seupartido, procedendo a uma clara vingança, antecedida de ameaça publicamente revelada, por terem estes se negado a garantir os votos dos parlamentares que ele necessitava para poder se livrar do seu processo de cassação na Câmara dos Deputados, disse. Cardozo poderia ter citado parlamentares do próprio Partido dos Trabalhadores, que, no ano passado, admitiam manter com Cunha um jogo em que cada um tentava barganhar indulgências. Não dá para esconder de ninguém que estamos com a faca no pescoço, disse o deputado federal Zé Geraldo (PT-PA), membro do Conselho de Ética da Câmara. Antes de pensar na cassação do Cunha, temos de pensar também no Brasil. Brasil, no caso, era sinônimo de Dilma. No dia 2 de dezembro, o tratado de não agressão ruiu. O PT retirou o apoio a Cunha no Conselho de Ética e, horas depois, Cunha acolheu o pedido de impeachment dos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr. e Janaina Paschoal. Até então, Cunha não havia acolhido 27 pedidos de impeachment.

Cunha não é o único responsável pela condução do processo contra Dilma. O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu o rito do impeachment e endossou o julgamento do Congresso. O que a Câmara e o Senado decidirem vai prevalecer, disse Luís Roberto Barrozo, ministro do STF. O julgamento final será feito pelo Senado, numa sessão conduzida pelo presidente do Supremo.

Dentro das regras firmadas pelo STF, Cunha faz o que pode para acelerar o julgamento. Convocou reuniões plenárias às segundas e sextas-feiras, quando o Congresso vive às moscas, e discute a realização de sessões em fins de semana. Na comissão do impeachment, o relator Jovair Arantes (PTB-GO) apresentou o relatório em que pede a cassação da presidente dois dias após ouvir a defesa de Cardozo antes do prazo a que tinha direito. Jovair e o presidente da comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), foram escolhidos num jantar na casa de Cunha, entre seus aliados no Conselho de Ética. Renato Ramos, assessor jurídico de Jovair na redação do relatório, é ex-advogado de Cunha.

Enquanto o processo contra Dilma corre, o julgamento de Cunha se arrasta. Já é o de mais longa duração no Conselho de Ética da Câmara. Em março, ele se tornou o primeiro parlamentarréu na Operação Lava Jato. Mas continua firme na presidência da Câmara terceiro posto na linha sucessória, que, com um eventual impeachment, torna-se o segundo.

O julgamento de Dilma é comprometido pela condução de Cunha? Líder do PSDB na Câmara, o deputado Antônio Imbassahy diz que não. Ele está seguindo o rito. Quem quer que fosse o presidente (da Câmara), teria de ficar nesse roteiro. Correligionário e desafeto de Cunha, o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) discorda. É uma excrescência, uma imoralidade, diz.

Eduardo Cunha contamina o processo de impeachment?

MARCELO MOURA

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