Ato do presidente da Câmara representa, para advogado, desvio de poder
Da Agência Brasil noticias@band.com.br
Na segunda parte da apresentação da defesa da presidente Dilma Rousseff, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, afirmou que o recebimento do pedido de impedimento da chefe do governo pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi um ato de “vingança” e, por isso, caracteriza desvio de poder.
Durante quase duas horas, Cardozo fez, na tarde desta segunda-feira (4), a defesa de Dilma na comissão especial da Câmara que analisa o pedido de impeachment da presidente.
Os membros da comissão não tiveram autorização para fazer perguntas durante a fala do ministro, mas, em três oportunidades, parlamentares favoráveis ao impeachment interromperam a exposição e foram repreendidos pelo presidente do colegiado, Rogério Rosso (PSD-DF).
Cardozo disse que há “indiscutível, notório e clamoroso desvio de poder” no recebimento do pedido do impeachment.
“Conforme [foi] fartamente noticiado pela imprensa, a decisão do presidente Eduardo Cunha não visou não visou à abertura do [processo de] impeachment, não era essa sua intenção, não era essa a finalidade. Sua Excelência, Eduardo Cunha, usou da competência para fazer uma vingança e uma retaliação a chefe do Executivo porque esta se recusara a dar garantia dos votos do PT no Conselho de Ética a favor dele”, argumentou Cardozo.
Cunha, vale lembrar, enfrenta processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Casa.
Na defesa apresentada à comissão especial, o advogado-geral da União rebateu os pontos do pedido de impeachment. Segundo Cardozo, o fato de a comissão ter ouvido os juristas autores do pedido feriu o direito de defesa da presidente. Para Cardozo, se a peça não era clara o suficiente, deveria ser negada. O ministro ainda ironizou a peça e a considerou “imprecisa” e “tecnicamente bastante reprovável, passível de sobrerrejeição por inépcia”.
Cardozo ressaltou ainda que, na exposição feita na semana passada, os juristas foram além do que foi acatado pelo presidente da Câmara no pedido de impeachment, o que, para o ministro, claramente afronta o direito de defesa da presidente da República.
“A defesa não foi intimada a acompanhar. Se o fosse, faria contestações.”
O ministro lembrou que, no pedido de impeachment, consta a edição de seis decretos não numerados, nos meses de julho e agosto de 2015, que abrem créditos adicionais. “Os decretos só podem ser considerados no âmbito dessa comissão para o ano de 2015, porque a Constituição da República é clara ao dizer que o presidente não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao seu mandato. E o ato do presidente da Câmara fez um claro corte.”
Ao final da exposição de Cardozo, deputados da oposição gritaram “fora, PT” e mostraram cartazes que pediam “impeachment, já”; parlamentares da base responderam: “não vai ter golpe”.
Impeachment sem base na Constituição é golpe de Estado
Se os termos da Constituição não forem observados, mesmo que se trate de um processo político, o impeachment será um golpe de Estado, disse Cardozo.
Segundo ele, o pedido de impeachment de um presidente da República precisa, obrigatoriamente, caracterizar um atentado à Constituição, apresentar ato imputável diretamente ao presidente e ação dolosa do mandatário do país. Caso não se observem tais termos, seria golpe de Estado, sim, afirmou Cardozo.
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De acordo com o ministro, o crime de responsabilidade exige que se configure atentado à Constituição e que o ato tenha sido praticado pelo presidente da República. “[Exige] que seja um atentado à Constituição, uma violência excepcional, capaz de abalar os alicerces do Estado e que tenha tipificação legal. Portanto, todo um conjunto de ingredientes necessários para a configuração desse processo. Fora desses pressupostos, qualquer processo de impeachment é inconstitucional, é ilegal”, detalhou o advogado-geral da União.
“O que é um golpe?
É a ruptura da institucionalidade, golpe é o rompimento de uma Constituição, golpe é a negação do Estado de Direito. Não importa se ele é feito por armas, com canhões ou baionetas caladas, se ele é feito com o simples rasgar de uma Constituição, sem base fática — ele é golpe”, acrescentou o ministro.
De acordo com Cardozo, atualmente, não tem mais havido golpes militares, mas isso não significa que golpes não continuem ocorrendo. “Por isso, hoje buscam-se recursos retóricos, buscam-se discursos de formulação de falsos ingredientes jurídicos para justificar golpes. E isso é grave.”