Propostas que incluem integrantes da Justiça e do Ministério Público em investigação de crimes de corrupção e punições por abuso de autoridade são apontadas como revide dos parlamentares Para Passarinho, juízes, promotores e procuradores devem ser julgados como qualquer cidadão
Brasília – O Congresso Nacional entrou em rota de colisão com o Ministério Público Federal (MPF) e o Judiciário ao priorizar, nesta e nas próximas semanas, a votação de projetos considerados por integrantes do próprio MP como retaliação à atuação de procuradores e juízes que integram a Operação Lava Jato.
Hoje, a comissão que analisa na Câmara o conjunto de medidas anticorrupção inspiradas em propostas do MPF decide se acrescenta ao relatório final, do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), a possibilidade de enquadrar juízes e membros do Ministério Público (MP) em crime de responsabilidade.
Em nota, as Câmaras de Combate à Corrupção e Criminal do MPF criticaram o funcionamento e o posicionamento da comissão e dos parlamentares em relação ao projeto inspirado nas “10 Medidas Contra a Corrupção”, apresentadas pela instituição com o apoio de 2,3 milhões de assinaturas.
O MPF considera a nova proposta uma retaliação à atuação do órgão na Lava Jato, que desvendou o esquema de propina na Petrobras e que ganhou novos capítulos tensos na semana passada, devido à prisão do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, do PMDB.
“Desvios funcionais, como abuso de poder, eventualmente cometidos por membros do Poder Judiciário e do Ministério Público, já são punidos pela legislação ordinária, tanto no âmbito criminal como no disciplinar e, ainda, no da improbidade administrativa. […] Criar uma esfera adicional de punição, à qual não estão sujeitos nem mesmo os próprios parlamentares, é descabido, desproporcional e atécnico podendo importar em pura e simples retaliação. Inaceitável, ainda, a inclusão de medidas como a anistia do caixa 2″, acusa a nota.
As medidas devem ser votadas e encaminhadas ao Senado até o dia 9, Dia Internacional de Combate à Corrupção.
Em entrevista ao DCI, defendendo a proposta, o presidente da Comissão, deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA), defendeu que os juízes, procuradores e promotores que cometerem crimes de corrupção devem ser julgados e punidos como qualquer cidadão.
Iguais perante à lei
“Todos os indivíduos são iguais perante à lei. Há uma crítica verdadeira, independentemente de retaliação ou não, de que juízes e procuradores não são julgados como qualquer outra pessoa. São julgados pelos conselhos nacionais deles. Eu acho que isso tem que ser revisto”, disse.
Na quinta-feira (17), a reunião da comissão marcada para apreciar o texto final a ser apresentado no plenário da Casa foi cancelada devido a divergências entre os membros.
Outro ponto polêmico do relatório é a tipificação do crime de caixa 2, que são doações a campanhas eleitorais sem registro oficial. O parecer de Lorenzoni prevê pena de até dez anos de prisão para a transgressão, mas não explicita a anistia a quem cometeu a prática antes da aprovação do projeto.
Embora não seja explícito, há parlamentares do PT, PCdoB e do PMDB que interpretam a proposta como uma anistia retroativa a políticos, partidos e empresários que cometeram a ilegalidade.
O argumento jurídico seria que, se a prática foi criminalizada, é porque antes não era crime. Além disso, usariam argumento constitucional de que uma lei não pode retroagir para prejudicar um réu, apenas para beneficiá-lo. Dessa forma, os envolvidos teriam de fazer esse questionamento na Justiça. “Se for crime de corrupção, não adianta, por mais que ponham anistia no Caixa 2, vão pegar por formação de quadrilha ou por qualquer outra coisa. Esse negócio de anistia que querem colocar não resolve o problema de quem fez recurso de maneira ilícita”, disse Passarinho.
Abuso de autoridade
Ao mesmo tempo, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), acelerou a votação de projeto de abuso de autoridade, que preveem punições a delegados de polícia, integrantes do Ministério Público e do Judiciário que se excederem em suas atribuições.
Prevê inclusive que magistrados não devem falar à imprensa sobre processos em que atuam. Renan quer votar a matéria no dia 6 de dezembro. Nesta quarta-feira (23), o tema será debatido em audiência pública com dirigentes das instituições.
Calheiros também instalou uma comissão para identificar os funcionários dos três Poderes que ganham supersalários, que deve apresentar hoje proposta para eliminá-los. O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Roberto Veloso, disse que a iniciativa de Renan tem como objetivo atrapalhar investigações.
“A medida é uma ação complementar ao projeto de abuso de autoridade defendido por Renan”, afirmou Veloso.
Abnor Gondim