Correio Braziliense: Uma semana de pauta conservadora

Projetos facilitam acesso a armas e restringem o conceito de família. Cunha também incluiu propostas de interesse do governo, como a que reajusta taxas

» Marcella Fernandes

» Natália Lambert

O ritmo de votação de propostas conservadoras na Câmara dos Deputados deve se acelerar esta semana. Após sucessivas prorrogações, está prevista para hoje a apreciação do PL 3722/2012, que revoga o Estatuto do Desarmamento, na comissão especial sobre o tema. Também deve ser votada em colegiado específico a Proposta de Emenda à Constituição 215/2000, que transfere do Executivo para o Legislativo a demarcação de terras indígenas. Diante dos recentes avanços de projetos que atentam contra aos direitos humanos, deputados apresentaram ontem dois requerimentos para frear a tramitação do Estatuto da Família.

Aprovado em comissão especial no último mês, o PL 6583/2013 limita o conceito de família a união entre homem e mulher. Como tramitava em caráter terminativo, podia seguir direto para o Senado. Ontem, porém, a deputada Erika Kokay (PT-DF) apresentou requerimento com 120 assinaturas para que o texto seja apreciado em plenário. O deputado Jean Wyllys (PSsol-RJ) apresentou pedido similar, com 69 assinaturas. O regimento exige 51. Diante dos números, a deputada Maria do Rosário (PT-RS), uma das signatárias, aposta que a proposta possa ser barrada e alerta para as consequências da medida. “O estatuto tem o poder de dizer quais as famílias receberão proteção social do Estado e quais serão atendidas por programas sociais, como o Bolsa Família e o Saúde da Família”, diz.

Outro texto que aguarda para ser incluído na pauta do plenário é o PL 5069/2013, que dificulta o atendimento a mulheres vítimas de violência sexual. De autoria do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na semana passada. Parlamentares contrários à medida têm conversado com líderes partidários para evitar que a proposta seja votada em plenário. “A nossa estratégia é mobilizar as mulheres e dar conhecimento ao país sobre a violência que esse texto traz consigo”, afirma Maria do Rosário.

Na sessão da comissão especial que trata do Desarmamento, marcada para hoje, deputados começarão a votar o substituto do relator, Laudívio Carvalho (PMDB-MG), ao Projeto de Lei 3.722. A intenção da proposta é flexibilizar o acesso à posse e ao porte de armas. O presidente da comissão, Marcos Montes (PSD-MG), afirma que a votação não será adiada. “O projeto está amadurecido, foram muitos meses de trabalho e a sociedade espera isso. Contra ou a favor, a sociedade espera que a comissão aprecie essa matéria.”

Aprovação

O deputado Ivan Valente (PSol) acredita que será difícil impedir a aprovação do texto na comissão e aposta no passo seguinte. “Já fizemos todas as intervenções possíveis para protelar a decisão. Não vejo como passar desta semana. Agora, vamos focar no plenário, onde a média ponderada é mais equilibrada e será mais fácil debater e argumentar.” Para ele, é complicado prever o encaminhamento do projeto por causa da atual situação do presidente da Casa, Eduardo Cunha. “Ele pode querer acelerar a tramitação, já que é um dos grandes inspiradores da proposta. A análise dependerá dos acontecimentos em relação a ele nesta semana”, pondera.

A aprovação da PEC 215 na comissão especial hoje também é data como certa, diante do grande número de membros do colegiado ligados ao agronegócio. O PSol apresentará voto em separado em que argumenta que a PEC é inconstitucional e viola direitos dos povos indígenas. Em meio a esse debate, outro fator que deve favorecer os ruralistas é a criação de uma CPI na Câmara para investigar a atuação da Funai e do Incra, o que depende da aprovação de Cunha e deve acontecer em breve. “São parte de uma agenda para desmoralizar o governo e tentar provar que esses órgãos não respeitam a lei”, critica o deputado Edmilson Rodrigues (PSol-PA).

No entanto, o presidente da Câmara também anunciou que incluirá na pauta projetos importantes para o governo. Entre eles, a medida provisória que autoriza reajustes em taxas cobradas pela Ancine, pelo Ibama e pelo Cade. Também devem ser apreciados o projeto de lei de repatriação de recursos e bens no exterior e a renegociação de dívidas da União e de estados.

Retrocesso

Confira o que deve ser votado no Congresso esta semana

Estatuto do Desarmamento

O Projeto de Lei 3.722/2012 modifica o Estatuto de Desarmamento de modo a facilitar a compra e o porte de armas de fogo. Após ser adiado diversas vezes por falta de entendimento, o parecer do deputado Laudivio Carvalho (PMDB-MG) deve ser votado hoje na comissão especial que discute o tema. Se aprovado no colegiado, o PL segue para o plenário.

Demarcação de terras indígenas

A Proposta de Emenda à Constituição 215/2000 transfere do Executivo para o Legislativo a atribuição de demarcação de terras indígenas, proíbe a ampliação daquelas já demarcadas e garante indenização aos proprietários de áreas dentro de reservas. Está prevista votação do relatório do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) nesta terça-feira na comissão especial que trata do assunto. Se aprovada no colegiado, a PEC precisa passar por dois turnos de votação nos plenários da Câmara e do Senado.

Criminalização da heterofobia

O Projeto de Lei 7.382/2010 penaliza a discriminação contra heterossexuais e determina que as políticas públicas incluam essa possibilidade. O texto recebeu parecer contrário da relatora na Comissão de Direitos Humanos, deputada Erika Kokay (PT-DF), e aguarda para ser votado no colegiado.

Atendimento a vítimas de estupro

Aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na semana passada, o Projeto de Lei 5.069/2013 aguarda para entrar na pauta do plenário. O texto, de autoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), obriga mulher vítima de violência sexual a mostrar o registro de ocorrência e exame de corpo de delito para ter acesso a atendimento no sistema de saúde e à pílula do dia seguinte.

Estatuto da família

Aprovado no início do mês em comissão especial, o Projeto de Lei 6.583/2013 reconhece como família apenas “a entidade familiar formada a partir da união entre um homem e uma mulher”. Deputados contrários à medida apresentaram requerimento para que o texto seja votado em plenário antes de seguir para o Senado. Como tramitava em caráter terminativo, não havia essa exigência.

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