Presidente se reúne com líderes da Câmara e do Senado para defender o pacote fiscal, tentar a aprovação da nova CPMF e se blindar contra a ameaça de impeachment. Deputado Rogério Rosso bate-boca com ministro da Fazenda, Joaquim Levy
PAULO DE TARSO LYRA
JULIA CHAIB
Ciente da ameaça que paira sobre o próprio mandato se não resolver a crise política com o Congresso e equacionar a crise econômica do país, a presidente Dilma Rousseff “voltou” a exercer o papel de chefe do Poder Executivo: reuniu pela manhã líderes da Câmara e, à tarde, os do Senado, para defender o pacote fiscal anunciado pela equipe econômica, a aprovação da CPMF e blindar-se contra o impeachment. Nos encontros, ela anunciou também que as articulações com o Congresso serão conduzidas pelo assessor especial Giles Azevedo e pelo ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini.
A depender do primeiro dia de conversas, contudo, Dilma pode considerar a batalha, sobretudo quanto à recriação da CPMF, perdida. Foram dois encontros bastante duros, nos quais os aliados deixaram claro a má vontade do Congresso para aumentar ainda mais a carga tributária. Mesmo em um cenário adverso, o governo não cedeu em um milímetro em sua intransigência: nenhum mea-culpa quanto à situação do país, tampouco explicação das razões que levaram o Planalto a encaminhar um orçamento deficitário em R$ 30 bilhões para, depois, corrigir em apenas R$ 26 bilhões e deixar a bomba para o Congresso resolver aprovando aumento de impostos.
Segundo relato dos presentes, em nenhum dos — poucos — encontros com a base aliada, se viu uma Dilma e um chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, tão tensos. O encontro foi tão áspero que chegou a haver um bate-boca entre o líder do PSD na Câmara, Rogério Rosso (DF) e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Os parlamentares já não haviam gostado quando o homem-forte da economia brasileira disse que era o Congresso — não o Orçamento encaminhado pelo Executivo com um rombo de R$ 30,5 bilhões — o responsável pelo rebaixamento da nota de crédito do país pela agência Standard & Poor s. Quando o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi questionado por Rosso sobre a ausência de incentivos para o setor produtivo, o caldo entornou.
Levy, em tom irônico e depreciativo, começou a questionar os “Pró não sei o que, pró não sei o que”, numa alusão aos incentivos fiscais para garantir o desenvolvimento de setores específicos da economia. Rosso, que foi executivo da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), aconselhou Levy a pisar no chão da fábrica. Depois, foi mais além. “Tire férias de 30 dias, ministro. Colocaremos um desenvolvimentista no seu lugar e, quando o senhor voltar, verá que o país estará muito melhor.” Os ânimos tiveram que ser apaziguados por Mercadante.
“Dificuldades”
O encontro com os aliados do Senado seguiu o mesmo script da Câmara. O líder do PT na Casa, Humberto Costa (PE), disse que o governo manteve o compromisso de fazer o ajuste “às custas dos programas sociais”. Mas o senador afirmou que também foram colocadas as “dificuldades” para que algumas propostas sejam aprovadas. “Foi feito um balanço realista e vamos continuar a discussão com o governo para ver como vamos trabalhar esses temas”, afirmou.
Durante cerimônia de entrega do Prêmio Jovem Cientista, Dilma defendeu o ajuste elaborado pela equipe de Levy. A presidente disse que a proposta de recriação da CPMF será enviada ao Congresso carimbada com a destinação dos recursos à Previdência. A petista disse ainda que a medida é necessária e não negou que a alíquota de 0,2% possa ser alterada pelos parlamentares. “A previdência tem uma queda quando diminui a atividade econômica. Então, a nossa proposta é carimbada. Ela vai assim, agora como será feito no Congresso é um outro processo de discussão. Nós nos empenharemos bastante. Primeiro, para aprovar essas medidas, porque elas são necessárias. E não são necessárias porque nós queremos tomá-las. Elas são necessárias porque passamos por um momento em que é fundamental que saiamos dessa situação de restrição fiscal o mais rápido possível, para poder voltar a crescer, para poder gerar os empregos necessários no país”, disse.
Dilma prometeu também apresentar até a próxima quarta-feira a reforma administrativa. Sem entrar em detalhes sobre a estrutura das mudanças, reafirmou a pretensão de cortar até 10 pastas, seja pela eliminação de ministérios ou pela junção com outras já existentes. “As junções não são apenas de ministérios, mas de órgãos, porque tem órgãos que são maiores que ministérios, bastante”, afirmou a presidente.
Sem mencionar a palavra impeachment, Dilma afirmou que o governo está atento às movimentações nesse sentido e fará de tudo para impedir que elas se concretizem. “O governo está atento a todas as tentativas de produzir uma espécie de instabilidade profunda no país”, disse. “Nós faremos tudo para impedir que processos não democráticos cresçam e se fortaleçam”, disse.
Bate-boca sobre o impeachment
Discussão sobre o impeachment
Um requerimento apresentado pela oposição no plenário da Câmara motivou uma discussão acalorada entre oposicionistas e governistas sobre o impeachment de Dilma. Durante discussão de matérias econômicas, o deputado Mendonça Filho (DEM-PE) apresentou uma questão de ordem para que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, esclarecesse no prazo de três sessões o trâmite que adotará na análise dos pedidos de afastamento. A partir desse momento, parlamentares se revesaram na tribuna para criticar ou defender o governo. O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) fez gestos com a mão que remetiam a roubo durante discurso do deputado José Guimarães, líder do governo na Casa. O petista leu o manifesto entregue à presidente em que seis partidos da base (PT, PMDB, PSD, PP, PcdoB e Pros) apoiam o mandato de Dilma.