Entrada de Marcelo Castro, candidato do PMDB à revelia do Planalto, na sucessão de Eduardo Cunha deixa ainda mais indefinida a eleição para presidente da Câmara. Sessão começa às 16h, com 14 candidatos registrados até agora
» PAULO DE TARSO LYRA
» NAIRA TRINDADE
» JULIA CHAIB
A Câmara dos Deputados chega hoje loteada à eleição para escolher quem sucederá Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no mandato tampão de presidente da Casa, que vai até fevereiro do ano que vem. A entrada do ex-ministro da Saúde Marcelo Castro (PMDB-PI) na disputa, após ser escolhido por 28 votos de seus correligionários, embolou de vez o jogo, roubou votos prometidos a outros candidatos e animou o PT, que escolheu um nome para apoiar e tentar se manter vivo no parlamento após o afastamento de Dilma Rousseff.
“Consegui os votos do meu partido e, agora, estou procurando conversas com as legendas que não têm candidato próprio, como o PT, o PCdoB, o PDT. Acho deselegante procurar quem anunciou algum nome. Estou confiante para chegar ao segundo turno e, de lá, para a vitória”, afirmou Castro. O ex-ministro da Saúde é um azarão que ganhou peso inesperadamente e deve, de cara, arrebanhar boa parte da esquerda, em uma articulação antecipada pelo Correio no último sábado.
Castro disputou internamente com Carlos Marun (PMDB-MS) e Osmar Serraglio (PMDB-PR). Dos 66 deputados da bancada, apenas 46 estavam presentes. Na primeira rodada de votações, o ex-ministro da Saúde de Dilma teve 17 votos, Marun; 11; e Serraglio, 11, e outros sete deputados se abstiveram. Por ser mais antigo, Serraglio foi para o segundo turno e o resultado cristalizou-se: Castro com 28 votos, contra 18 do adversário.
A decisão mexeu com as estruturas da Câmara e do Planalto. Na hora em que o resultado foi confirmado, o presidente em exercício, Michel Temer, almoçava com a Frente em Defesa da Agropecuária. Acabou questionado pelo deputado Nilson Leitão (PSDB-MS). “Como o PMDB deixa vencer um candidato que foi contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff?”, quis saber. Temer, com jeito enigmático, devolveu. “Essa é a maior prova de que eu não estou me envolvendo nessa disputa”, completou o presidente em exercício.
Mais cedo, no entanto, o chefe da Casa Civil, ministro Eliseu Padilha, confirmou o empenho do governo — até o momento, completamente em vão — de encontrar um nome de consenso na base. Questionado se o governo trabalha para que Marcelo Castro desista da candidatura à Presidência da Câmara, Padilha afirmou que “não só o Marcelo Castro, mas queremos que fique um só”, afirmou. “Nós não interferimos na definição de quem seja, mas queremos sim que tenha um candidato da base. Nós queremos a unidade da base, e unidade se constrói sem disputa.”
Padilha defende que sejam costurados acordos para os próximos mandatos da Presidência da Câmara. “Pode haver esse conserto. Nós podemos chegar à conclusão de que pode haver um conserto e nós estamos pensando que de repente possa fazer esse conserto para 2016, 2017, 2018. Não precisa ser só 2016”, afirmou.
Agenda
Acompanhado do líder do PMDB, Baleia Rossi (SP), e do deputado José Priante (PA), Marcelo Castro tentou, sem sucesso, se reunir com Temer. Eles conversaram com o ministro de Governo, Geddel Vieira Lima, que prometeu que haveria um encaixe na agenda dele para atender o ex-ministro da Saúde ainda ontem. Até o fechamento desta edição, o encontro ainda não havia ocorrido.
A entrada de Castro também desequilibrou o jogo nas demais candidaturas internas. “A entrada do Marcelo nessa disputa diluiu muito o voto. Temos de trabalhar pela unidade das candidaturas. Quanto mais candidatos tivermos, menores as chances de vitória. Quanto menos tivermos, maiores as chances”, afirmou o líder do PSD, Rogério Rosso (DF).
No PR, que fechou o apoio a Giacobo (PR) por pressão de Valdemar Costa Neto — condenado no processo do mensalão –, também houve ranger de dentes. “É ruim para a gente, porque o Castro ‘bica’ votos onde o Giacobo também bica”, lamentou um articulador da campanha do candidato paranaense.
Nem o chamado Centrinho ficou imune ao “terremoto” Castro. “Boa parte do PSB pode ir com Castro. Ele é leve, tem bom trânsito no partido. Especialmente depois de o PSDB vetar o nome do Júlio Delgado”, reclamou um parlamentar socialista. Os tucanos negam que tenham vetado o apoio a Delgado, que poderá desistir da candidatura antes de o pleito começar. “Apenas houve uma avaliação interna de que o nome de Rodrigo Maia (DEM-RJ) tem mais chances de vitória”, rebateu um cacique tucano.
Maia não quis polemizar com a entrada de Castro na disputa. “Minha base são os quatropartidos do lado de cá (PSDB-DEM-PPS-PSB). Se compreendermos do lado de cá que podemos estar juntos, essa candidatura será imbatível”, apostou Maia. Mas os tucanos também vêm sendo assediados pelo PP, que lançou ontem o nome de Esperidião Amin (SC). “Ele foi no PSDB, conversou conosco e foi muito bem recebido. É um nome leve, articulado e limpo”, afirmou um deputado do PSDB.
Análise da notícia
Reflexo em 2017
Pela primeira vez na história recente da Câmara, o Palácio do Planalto assiste, impassível, a eleição para presidente da Casa sem ter um candidato para chamar de seu. A cautela que os articuladores políticos palacianos adotaram para não influenciar na disputa interna, receosos de repetir o desastre de Dilma Rousseff na disputa entre Eduardo Cunha e Arlindo Chinaglia, e de Lula no embate Luiz Eduardo Greenhalgh x Severino Cavalcanti, deu um efeito contrário. A base está rachada e ninguém sabe como os aliados estarão no alvorecer de quinta-feira, quando o novo presidente da Câmara tiver sido eleito.
A trilha de movimentação dos quatro nomes mais cotados para vencer a disputa dão dimensão dos riscos que o Planalto corre. Rogério Rosso é o candidato do Centrão; Rodrigo Maia é do Centrinho; Fernando Giacobo (PR-PR) é do baixo clero; e Marcelo Castro, da oposição.
Desde a entrevista que deu em 24 de junho, Temer afirmou que era prudente ter apenas um candidato da base, mas que não trabalharia diretamente para isso, deixando a tarefa a cargo dos deputados. Como não meteu a mão na massa, ficou tarde demais para se envolver no processo. Não tem como atuar no primeiro turno, há quem duvide que conseguirá interferir no segundo. Resta saber o que fará para pacificar as coisas no pós-eleição.
E pensar que os problemas não acabam na quinta. Daqui a pouco mais de seis meses, os mesmos atores estarão novamente se engalfinhando, de olho, aí sim, no mandato de dois anos de presidente da Câmara. A partir de 2017, a sucessão do peemedebista começará a ser escrita no Congresso. Ele terá tinta para palpitar nessa história ou deixará a cargo dos deputados, como agora? (PTL)
Quem é quem
Confira os 14 deputados que registraram a candidatura até o fim da noite de ontem. O número de postulantes à Presidência da Câmara
Fausto Pinato (PP-SP)
Candidatura de parte da bancada. Primeiro relator do processo do ex-presidente Eduardo Cunha no Conselho de Ética, Pinato quer resgatar a confiança dos brasileiros no parlamento propondo agenda positiva; pretende redesenhar o modelo de política; aprovar medidas para recolocar o país no caminho do crescimento; dialogar com os Poderes respeitando a independência, além de valorizar servidores da Casa.
Carlos Henrique Gaguim (PTN-TO)
Pretende “desburocratizar” o Congresso; dar autonomia ao parlamento; democratizar a escolha da pauta, respeitando a proporcionalidade dos partidos; também quer uma pauta participativa; defende o fim das votações na madrugada; quer garantir os compromissos para a governabilidade para acelerar o país.
Carlos Manato (SD-ES)
Candidatura do Solidariedade, Manato promete trabalhar para conquistar uma Câmara ética e atuante, valorizando a atividade parlamentar; quer responder efetivamente às demandas da Casa; respeitar o Regimento Interno; conseguir maior participação da sociedade nas propostas da Casa; dar mais transparência; fiscalizar os gastos públicos; e valorizar os deputados na definição das pautas.
Fábio Ramalho (PMB-MG)
Tem apoio do partido. No terceiro mandato na Câmara, Ramalho defende contribuir para a reconstrução do país. Como prioridade, quer reformas estruturantes, como a tributária, previdenciária e a eleitoral, permitindo a retomada do desenvolvimento econômico, a geração de empregos e a melhoria das condições de vida do povo. Para Ramalho, a Câmara precisa ser forte.
Giacobo (PR-PR)
Tem o apoio de parte do Centrão. Segundo-vice-presidente da Câmara, Giacobo tem comandado a Casa nas principais votações durante o afastamento de Eduardo Cunha. Entre as propostas está a intenção de manter a estabilidade do país; agir com compromisso e responsabilidade; resgatar a imagem da Câmara, assegurando os interesses da nação. O slogan dele é “Câmara pelo Brasil: compromisso e responsabilidade”.
Cristiane Brasil (PTB-RJ)
Tem candidatura independente. Está no primeiro mandato. Tem como proposta aumentar a participação popular no legislativo; respeitar os partidos de oposição e a participação das minorias; dar prioridade às pautas de estado para retomar o crescimento da economia e o emprego; defender a agenda própria do Legislativo; E, por fim, conduzir a casa com independência e com responsabilidade.
Luiza Erundina (PSol-SP) É a candidata do partido. Com experiência de cinco mandatos e suplente da atual Mesa Diretora, Erundina quer restaurar o papel ético-político da Câmara. A deputada deseja resgatar a Câmara do Povo, onde a cidadania tenha acesso e defende a legalidade e regimentalidade como instrumentos para o exercício da função institucional. A candidata se diz capaz de liderar uma reforma política que moralize a democracia.
Rogério Rosso (PSD-DF)
Tem apoio de deputados do Centrão. Líder do PSD na Câmara já no primeiro mandatocomo deputado, Rogério Rosso (DF) quer a independência do legislativo e a ampliação do diálogo entre os poderes; valorização da atividade parlamentar; defesa do colégio de líderes na definição da pauta; respeito dos trabalhos das comissões; racionalização dos horários das sessões; valorização da bancada feminina; integração das frentes parlamentares.
Evair Vieira de Melo (PV-ES)
Vice-líder no partido na Câmara, Evair quer transformar o colégio de líderes em Conselho Deliberativo; fazer rodízio na direção dos trabalhos da Mesa; escolher secretário da Mesa por meio de lista tríplice, com mudança periódica de atuação; dar total transparência a qualquer despesa da Presidência da Câmara, além de outras propostas registradas na Secretaria da Mesa.
Beto Mansur (PRB-SP)
Tem apoio do partido. Primeiro-secretário da Mesa Diretora, Mansur almeja recuperar a imagem da Câmara perante a opinião pública; trabalhar em prol de uma agenda positiva; manter diálogo permanente com os parlamentares e lideranças partidárias; ampliar e favorecer a discussão de temas nacionais; implementar ações que valorizem servidores; incentivar a participação da bancada feminina na Casa.
Esperidião Amin (PP-SC)
Tem apoio de parte do partido e do PSDB. No terceiro mandato, Amin tem como meta o respeito ao Regimento Interno; diálogo permanente com vistas a uma melhor convivência do contraditório; organização e aprovação de cronogramas de trabalho com antecedência (ano eleitoral e pós-eleições); fortalecimento do colégio de líderes na definição da pauta; transparência na gestão da Casa.
Rodrigo Maia (DEM-RJ)
Diz ter apoio de parte do PSDB, PPS, do Centrão e do Centrinho. No quinto mandato na Câmara, Maia afirma que vai trabalhar no fortalecimento do legislativo, na recuperação da autoestima dos deputados. Também quer batalhar pela união e pacificação dos partidos, buscando consenso legislativo no espaço democrático, onde todas as correntes têm de ser ouvidas.
Marcelo Castro (PMDB-PI)
Será o candidato da bancada do partido. A assessoria de imprensa não enviou as propostas até o fechamento da edição.
Miro Teixeira (Rede-RJ)
Decano da Câmara, Miro Teixeira (Rede-RJ) registrou candidatura no início da noite de ontem. Também não enviou as propostas.