Correio Braziliense | Nas Entrelinhas

Somente após a decisão final do impeachment e as eleições de outubro, Temer terá mais lastro político para reequilibrar o jogo de forças com o Congresso

por Ivan Iunes

ivaniunes.df@dabr.com.br

A vez do Congresso

Foi lugar-comum desde o governo Fernando Henrique Cardoso, especialmente nas gestões petistas, o predomínio do Executivo sobre o Legislativo. A possibilidade de edição de medidas provisórias, a caneta com plenos poderes para direcionar a liberação de emendasparlamentares e o enorme contingente de cargos e ministérios para distribuição entre aliados fizeram com que o Palácio do Planalto avançasse sobre o Congresso Nacional em uma queda de braço desproporcional. Se há uma constatação possível em duas semanas de governo Michel Temer, é exatamente a de que o eixo do poder mudou de endereço na Praça dos Três Poderes.

Desde que colocou em curso a marcha do impeachment de Dilma Rousseff e afastou a petista do Palácio do Planalto, o Congresso conseguiu emplacar, contra a vontade de Temer, ministros improváveis, um líder suspeito e até a volta do Ministério da Cultura. Até o último momento, o presidente interino tentou um nome alternativo para fazer a interlocução do Planalto com parlamento. Acabou tendo de aceitar a imposição de André Moura (PSC-SE), deputado também conhecido como André “Cunha”, em referência à ligação com o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Em relação à Cultura, Temer devolveu a autonomia à pasta ciente de que, se não o fizesse, as duas Casas forçariam a medida com a aprovação de emenda à medida provisória editada pelo peemedebista com a nova estrutura da Esplanada. O que ficou ruim foi a demora com que ele se decidiu pelo recuo. Foram oito dias de ataques e quatro recusas ao cargo de secretário de Cultura para que o peemedebista recriasse a pasta. A demora teve alto custopolítico. Mesmo com o recuo, a mobilização em torno do ministério, já consolidada, emulou para o “Fora, Temer” e deve persistir incomodando.

A pressão sobre o presidente ainda interino faz com que o Executivo se enfraqueça ainda mais diante do Legislativo. Para afastar a chance de Dilma Rousseff voltar a despachar no Planalto, Temer sabe que precisa aprovar a revisão da meta fiscal do governo, ao menos encaminhar a reforma previdenciária e ainda garantir os 54 votos necessários no Senadopara confirmar a perda do mandato da petista. Num indicativo de que os tempos são outros, o presidente interino deve ir ao encontro de lideranças partidárias da Câmara para negociar uma pauta para a Casa, além de alternativas à CPMF. Em um passado recente, a reunião seria no Palácio do Planalto. Agora, será na casa do líder do PSD, Rogério Rosso (DF).

Dificilmente, o peemedebista conseguirá dar a cara que gostaria ao governo, pelo menos até meados de setembro. Somente após a decisão final do impeachment e as eleições de outubro, Temer terá mais lastro político para tentar equilibrar o jogo de forças com o Congresso. Esse processo, contudo, só deve voltar à normalidade depois das eleições de 2018. Isso a depender do resultado das urnas. Em 2014, com a desidratação no parlamento do partido da presidente eleita, o pleito só serviu para colocar mais gasolina no debate.

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