O resultado das eleições sinaliza como serão as negociações do governo com o Legislativo para promover reformas. A pulverização da base aliada, com crescimento do centrão, pode dificultar a aprovação do ajuste
» ROSANA HESSEL
As eleições municipais antecipam o novo mapa das forças políticas que disputarão o pleito presidencial de 2018 e sinalizam como serão as negociações no Congresso Nacional para o presidente Michel Temer aprovar as reformas. Houve enfraquecimento do PT, continuidade da liderança do PMDB e fortalecimento do PSDB, que se consolida como segundo maiorpartido em número de prefeituras. As legendas do chamado centrão, como PP, PR e, sobretudo, o PSD, que se firmou na terceira colocação, abocanharam o espaço deixado pelos petistas nas urnas. Essa pulverização da base aliada poderá dificultar a aprovação do ajuste fiscal, dizem especialistas.
“O diálogo e o consenso ficarão mais difíceis com um governo com muitos partidos na base tanto pela quantidade quanto pela qualidade destes personagens”, alerta o cientista políticoCarlos Melo, professor do Insper. Para ele, o segundo turno que se desenhou em várias capitais, como Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba, devem adiar ainda mais a agenda de reformas, pois, onde estiver a oposição, essas propostas serão criticadas e os governistas não vão querer se expor com esses temas. “Com a prorrogação do período eleitoral, serão inevitáveis novos atrasos na agenda”, pontua.
Diante da dificuldade para avançar no ajuste fiscal, o governo está indo cada vez mais devagar. A agenda está limitada à Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que limita os gastos públicos à inflação do ano anterior, a PEC 241/2016. Hoje, o relator da proposta, o deputado federal Darcísio Perondi (PMDB-RS), deverá concluir o relatório com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para fazer a leitura do texto na comissão especial, amanhã. A expectativa é que a votação em dois turnos na Câmara dos Deputados esteja concluída até o fim do mês. São necessários 308 dos 513 votos para aprovação.
A reforma da Previdência não passará neste ano, dizem especialistas. “As demais, como a trabalhista e a tributária, dificilmente ocorrerão neste governo. Talvez haja algum avanço na reforma política”, destaca o economista Bruno Lavieri, sócio da 4E Consultoria. “A dificuldade é a articulação com estados e municípios. É preciso ter um poder político muito forte dentro do Congresso. Para a PEC ficar em pé, depende da reforma da Previdência”, diz.
Para André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, o governo conseguirá aprovar o teto. “Mas depois não vai conseguir comprar a telha porque o telhado estará cheio de goteiras”, sentencia. Pelas contas do economista João Augusto de Castro Neves, diretor para a América Latina do Eurasia Group, em Washington, há 80% de chances de o governo aprovar a PEC do teto ainda neste ano, já para a reforma da Previdência, esse percentual cai para 60%, apenas no ano que vem.
Neves alerta que haverá uma disputa de forças entre PSDB e PMDB a partir de 2018. “Teremos uma fragmentação do poder. O PSDB poderá ser uma faca de dois gumes. Beneficiou-se ao se manter como a segunda maior força em número de prefeituras. Mas está rachado”, afirma. “É evidente que qualquer racha no partido ou na base será perigoso, mas isso não pode ser descartado”, completa.
Na avaliação do cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria, não há outro caminho crível a não ser as reformas. “O PSDB e o PMDB devem se apoiar para sustentar essa agenda, porque o destino político das duas legendas passa pelo ajuste fiscal. Para o PSDB será bom se o PMDB conseguir avançar mais, porque o custo político será reduzido nas próximas eleições. Ao mesmo tempo, se ela der certo e a economia avançar, o bônus ficará com o PMDB. Essa lógica e o senso de urgência vai durar até 2018, porque vai gerar a necessidade dos dois partidos se diferenciarem”, avalia.
Custo político
A falta de avanço na agenda de reformas poderá comprometer o avanço da economia. O economista Roberto Padovani, do banco Votorantim, destaca que as eleições funcionaram como termômetro da oposição ao governo federal. “A política é importante para a economia. A questão econômica foi um dos pontos principais para a fragilização do governo Dilma”, avalia. “À medida que a confiança do consumidor e do empresário voltarem, reativando a economia, a tendência é fortalecer a estabilidade política”, acrescenta.
O líder do PSD na Câmara, deputado Rogerio Rosso (DF), informa que Temer e ospartidos da base têm consciência da importância da aprovação das reformas para contribuir para essa melhora no quadro econômico e, por isso, estarão empenhados para mobilizar suas bancadas para garantir a aprovação. “As eleições municipais mostraram o enfraquecimento do PT e aliados na grande maioria dos municípios do país”, afirma. “Por outro lado, teremos uma demonstração das forças partidárias e políticas que terão protagonismo neste momento. Em especial, os partidos que compõem a base do presidente Temer, que terão a oportunidade de fortalecimento de suas presenças no cenário político.”